sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Capítulo 14: Dancin Days

CENA 01. HARAS DONA CAROLINA. CASA GRANDE. SALA. INTERIOR. NOITE
CONTINUAÇÃO IMEDIATA DO CAPÍTULO ANTERIOR.
CELINA ABRE UM SORRISO AMARELO PARA FERNANDA, QUE DISPERSA. AMANDA REGISTRA O EMBATE, CÍNICA.
AMANDA – (Se aproximando) Aconteceu algo, Celina?
CELINA – (Disfarça) Imagina querida, nada. Apenas recepcionando a veterinária do nosso Haras.
AMANDA – (Provoca) Interessante. A veterinária freqüentando a festa de Natal da família dos patrões. É no mínimo generoso da sua parte.
CELINA SORRI AMARELO PARA AMANDA E SAI A DEIXANDO SOZINHA. AMANDA PENSATIVA.
CORTA PARA BRUNO E MARIANA.
MARIANA – Só eu que tô achando essa reunião um porre?
BRUNO – Eu também preferia estar no Rio com nossos amigos. Não sei o que eu tava pensando quando vim fazer figuração em filme de Natal da Sessão da Tarde.
MARIANA – (Ri) Que tal nós subirmos e fazermos algo mais interessante.
MARIANA SORRI MALICIOSA. BRUNO ACOMPANHA O SORRISO.
BRUNO – Adoraria fazer isso agora, mas se eu sair dessa sala, dona Celina me enfia no lugar do leitão, com direito á maçã na boca e tudo.
MARIANA – Credo!
OS DOIS RIEM.
CORTA PARA DANTE SE APROXIMANDO DE CADÚ.
DANTE – Cadú, não parece animado com o Natal. Afastado da família, dos amigos.
CADÚ – Nunca fui de comemorar essas datas, Dante. Acho isso tudo tão comercial. As relações são superficiais nessas ocasiões, pode perceber.
DANTE – Eu acho uma data simbólica. Aproveitarmos essas reuniões com a família, nos aproximarmos mais, sermos mais tolerantes.
CADÚ – Não tem sentido quando a sua família vive o ano inteiro em guerra e no Natal, resolvem baixar as armas e saírem de trás das trincheiras.
DANTE – (Ri) Quem sabe também não seja a oportunidade ideal para se encerrarem antigas e arrastadas guerras?
CADÚ PENSATIVO OLHA EM DIREÇÃO À CELINA E FRANKLIN. DEPOIS OLHA PARA DANTE, QUE SORRI.
CORTA PARA AMANDA, PRÓXIMA DE BRUNO E MARIANA.
AMANDA – Fiquei olhando aqui de canto, analisando esteticamente e acho vocês dois lindos juntos.
MARIANA – Mãe, não começa.
AMANDA – Mas é verdade, Mariana! Os dois são fotogênicos, ficariam lindos em uma capa de revista. Já pensou Bruno?
BRUNO – Amanda confesso que não. Na verdade, nunca foi uma ambição minha aparecer em nenhuma capa de revista, ainda mais, fingindo felicidade.
MARIANA – Como assim fingindo? Você não está feliz de verdade?
BRUNO – Não quis dizer nesse sentido.
AMANDA – Não importa! O novo casal fica lindo junto!
AMANDA SORRIDENTE, CELINA APROXIMA-SE.
CELINA – Novo casal?
FAZ CARA DE POUCO CASO.
AMANDA – Isso, Celina. Bruno e Mariana estão juntos. Uma união da nossa família, não é um sonho?
CELINA – (Debochada) Melhor que qualquer aliança comercial, querida!
AS DUAS SORRIEM FALSAS.
CORTA PARA, FERNANDA DE CANTO, CONVERSA COM UMA MOÇA, TROCA OLHARES DISCRETOS COM FRANKLIN, QUE TENTA DISFARÇAR. CELINA OLHANDO POR CIMA, A SITUAÇÃO, INCOMODADA.
CORTA PARA:

CENA 02. APARTAMENTO DE ALBERICO. SALA. INTERIOR. NOITE
CLIMA ANIMADO. EM CENA ESTÃO ALBERICO, FÁTIMA, CARMINHA, JAMIL, JULIANA, VITÓRIA, PAULINA, EDGAR, ÁUREA, INÊS E GUIDA. TODOS FALANDO AO MESMO TEMPO, AGITAÇÃO. ALBERICO BATE COM UMA COLHER EM UM COPO VAZIO, CHAMANDO A ATENÇÃO DO RESTANTE.
ALBERICO – Bem, tá tudo muito bom, tudo muito bem, todos muito animados, mas o que importa é o momento mais aguardado da noite.
PAULINA – A troca de presentes!
ALBERICO – Isso mesmo, minha querida Paulina. A troca de presentes da família!
VITÓRIA – Tio, eu posso começar?
ALBERICO ABRAÇA VITÓRIA, SINALIZANDO POSITIVAMENTE. VITÓRIA VAI AO CENTRO DA SALA, PEGANDO UM PRESENTE NA ÁRVORE DE NATAL, CHEIA DE PACOTES EM BAIXO.
VITÓRIA – O meu presente vai para uma pessoa especial, que após a morte dos meus pais me criou com muito amor e com muita dedicação, nunca me deixando faltar nada, essa pessoa é... Tia Fátima.
TODOS APLAUDEM. FÁTIMA VAI ATÉ VITÓRIA E PEGA O PRESENTE, EMOCIONADA.
FÁTIMA – Ô minha filha, você não foi criada como se fosse minha filha, você é minha filha. Minha filhinha caçula do coração.
VITÓRIA – Eu sei tia. Te amo muito. Você e tio Alberico.
AS DUAS SE ABRAÇAM. FÁTIMA ABRE O PACOTE, TRATA-SE DE UM VESTIDO, TODOS AGITAM. FÁTIMA COLOCA O VESTIDO SOBRE O CORPO.
FÁTIMA – Acho que vai ficar meio curto.
ALBERICO – Ai, ai, ai... Não vou gostar nada de ver essas pernas de fora.
TODOS RIEM.
CONRADO – (V.O) Mas acho que o mundo precisa ver essas pernas nas ruas, não é?!
TODOS OLHAM EM DIREÇÃO À PORTA. CONRADO PARADO COM UM PRESENTE EM MÃOS.
CONRADO – Me desculpe, a porta estava aberta.
FÁTIMA CONSTRANGIDA. ALBERICO OLHANDO SEM ENTENDER PARA CONRADO, QUE SE APROXIMA.
CONRADO – E claro que o comentário foi uma brincadeira.
GUIDA – (Se aproximando) Que bom que você veio, achei que não viria mais, lindo.
CONRADO SORRI E A CUMPRIMENTA COM UM BEIJO NO ROSTO. ELA FORÇA O BEIJO E QUASE PEGA NA BOCA. CLOSE DOS DEMAIS EM CENA.
GUIDA – Que lindo, trouxe um presente pra mim!
CONRADO – (Direto) Na verdade, esse presente não é pra você.
CONRADO VAI ATÉ FÁTIMA, QUE FICA NOTORIAMENTE CONSTRANGIDA E ESTICA O BRAÇO COM O PACOTE.
CONRADO – É pra você, Fátima.
FÁTIMA – (Surpresa) Pra mim um presente?
ÁUREA – Mamãe ganhando presente do vizinho?
ÁUREA LANÇA UM OLHAR MALDOSO PARA ALBERICO. CARMINHA A FUZILA COM O OLHAR.
CONRADO – É pra agradecer a hospitalidade da qual eu fui tão bem recebido aqui, principalmente pela dona Fátima.
ÁUREA CONTINUA COM UM OLHAR DE DEBOCHE. CARMINHA SUAVIZA.
CARMINHA – Obrigada, Conrado. Nós também ficamos felizes em ter você aqui.
CONRADO SORRI PARA CARMINHA. ALBERICO SE APROXIMA.
ALBERICO – Deveria ter trazido um presente pra mim, já que era pra agradecer.
CONRADO – Não foi com uma intenção que./
ALBERICO COMEÇA A RIR.
ALBERICO – Estou brincando, rapaz. Sente-se, Conrado. A nossa ceia será servida daqui a pouco.
FÁTIMA E CONRADO SE OLHAM. CLIMÃO NO AR. TODOS OS PRESENTES CONTINUAM A TROCA DE  NATAL. ÁUREA AINDA OS OLHANDO COM DESCONFIANÇA.
CORTA PARA: JULIANA E JAMIL DE CANTO, CONVERSAM.
JAMIL – Mas eu juro que não entendo. Essa sua decisão de se manter distante da sua filha só vai te fazer sofrer mais, Jú. Não vai acabar com a sua aflição.
JULIANA – Já ouviu naquela frase: “Se quiser evitar decepções, diminua suas expectativas”? Então, depois da minha discussão com a Amanda, eu percebi que tava colocando muita esperança em cima desse reencontro com a Mariana e talvez não fosse bem recebida por ela.
JAMIL – É sua filha. Não tem como não receber bem uma mãe.
JULIANA – Ou tem, meu amigo. A Mariana foi criada de outra forma, em outro mundo, tendo do bom e do melhor. Como vou chegar á essa altura da vida e desmontar o castelo dos sonhos dela? Eu tenho que cercar terreno, não é só assim, chegar e pronto. Ela vai me hostilizar.
CARMINHA VEM SE APROXIMANDO DOS DOIS.
CARMINHA – Juliana, a Amanda tem dinheiro apenas pra oferecer pra Mariana, você tem amor. É mãe dela. O que a Amanda tem, todo mundo pode ter, agora o que você é, isto ela não pode ser, nem que queira.
JULIANA – Eu quero muito pedir para os dois que nunca comentem com ninguém daqui que eu tenho uma filha. Que essa filha é a Mariana, por favor.
JAMIL – Jú, já dissemos que nunca vamos falar nada sobre você ou sobre o seu passado sem a sua autorização. Sinceramente, não gosto dessa falsa vida que criamos pra você, mas não tem outra alternativa.
CARMINHA – Mas é momentâneo. Uma hora isso tudo passa e será esclarecido. Logo você vai poder contar a verdade pra todos. Tenho certeza!
JULIANA FICA PENSATIVA. CARMINHA ABRAÇA JAMIL.
CARMINHA – Enfim, eu vim chamar os dois para a Ceia. Já vai ser servida e o papai quer dizer as palavrinhas tradicionais de sempre.
JAMIL – Seu Alberico não muda mesmo.
CARMINHA – Nunca!
OS DOIS RIEM E VÃO SAINDO. JULIANA PENSATIVA, SE VIRA PARA TRÁS E DÁ DE CARA COM VITÓRIA. VITÓRIA NUMA EXPRESSÃO SURPRESA, A ENCARANDO.
JULIANA – Vitória?! Você... Você tava aqui?
VITÓRIA BALANÇA A CABEÇA POSITIVAMENTE.
JULIANA – (Nervosa) Você estava aqui à quanto tempo?
VITÓRIA – (Assustada/ Disfarça) Eu cheguei agora.
JULIANA SE APROXIMA DE VITÓRIA.
JULIANA – Por favor, não minta.
VITÓRIA BAIXA OS OLHOS E VOLTA A ENCARÁ-LA.
VITÓRIA – Isso tudo o que eu ouvi... Isso tudo é verdade, Juliana? A Mariana, a filha da Amanda Pratini, na verdade ela é sua filha?
CLOSES ALTERNADOS. EM JULIANA, NERVOSA.
CORTA PARA:

CENA 03. HARAS DONA CAROLINA. CASA GRANDE. SALA. INTERIOR. NOITE
COMEMORAÇÃO DE NATAL CONTINUA ROLANDO NA SALA. AMANDA E HENRIQUE DE CANTO, CONVERSAM.
HENRIQUE – Pelo amor de Deus, Amanda, você nunca tinha me dito isso! Porque você nunca me disse que a sua irmã era uma presidiária?
AMANDA – Uma coisa dessas não se fala como se conta uma receita de bolo, Henrique.
AMANDA RESPIRA FUNDO, OLHA PARA OS LADOS, DISFARÇANDO.
AMANDA – (Encara) Isso tudo também é complicado pra mim. É a história da minha família, da minha filha.
HENRIQUE – (Corrige) Sua sobrinha!
AMANDA – Minha filha! Eu criei a Mariana desde pequena, tenho amor por ela. Amor de mãe, você não entende? O sentimento que eu tenho pela Mariana é o de mãe. A Juliana não pode simplesmente sair agora da cadeia e tentar reaver anos de convivência ao lado da Mariana, sendo que eu a criei, a eduquei. Eu amei a Mariana profundamente com o meu mais puro e sincero sentimento de mãe!
HENRIQUE – Para com isso, Amanda. Você tem com a Mariana uma relação de casinha de bonecas. Sempre foi assim. Exibia a menina como uma bonequinha de luxo para as amigas. Essa é a verdade. O que você não quer é perder essa pose de família para as capas de revista.
AMANDA – (Alterada) Nunca mais repita isso!
AMANDA SE CONTROLA, OLHA OS DEMAIS. DISFARÇA.
AMANDA – Nunca duvide do meu amor pela minha filha.
HENRIQUE – Mais alguém sabe dessa história da sua irmã?
AMANDA – Infelizmente, aquela vadia se aproximou de uma gentinha do subúrbio, de um antigo amigo nosso, de infância. E este amigo conseguiu um emprego lá na Baronesa à base de chantagem.
HENRIQUE – (Pensativo) Um amigo que conseguiu na Baronesa um emprego./ (Se corta/ Surpreso) O Jamil é o tal amigo de infância?
AMANDA CONFIRMA.
HENRIQUE – Bem que eu senti que aquele penetra não tinha conseguido o emprego com você pelas ótimas referências profissionais. Desgraçado!
AMANDA – Ele chantageou incentivar a Juliana a continuar com essa idéia fixa de procurar a Mariana. Pra dar um cala boca nele, eu preferi dar um emprego.
HENRIQUE – Impressionante! Até que o pobrinho foi engenhoso!
AMANDA – Relaxa que cada um tem de mim o que cativa. O que é dele tá guardado!
HENRIQUE – A Bibi, ela é sua melhor amiga, ela sabe da Juliana?
AMANDA – A Bibi nos viu juntas na noite de inauguração, mas acho que não sabe. Ela desconfia, tentou arrancar alguma informação, mas eu sou mais esperta anos luz. Não deixei transparecer a nossa ligação.
HENRIQUE – Menos mal. A Bibi poderia contar pra outra amiga de confiança e isso se espalhar pela sociedade carioca.
AMANDA – Deus me livre! Essa história não pode vazar de forma alguma. Não preciso disso na minha vida agora! Sem escândalos!
HENRIQUE – Você sabe que pode confiar em mim. Eu nunca contaria isso pra ninguém.
AMANDA – Exatamente por isso estou desabafando com você.
AMANDA SORRI SAFADA.
AMANDA – E essa noite de Natal ainda não terminou. Eu ainda quero o meu presente especial.
HENRIQUE RETRIBUI O SORRISO. NOS DOIS.
CORTA PARA:

CENA 04. APARTAMENTO DE ALBERICO. SALA. INTERIOR. NOITE
Continuação cena 02/ Cap. 14.
JULIANA MUITO NERVOSA.
JULIANA – Vitória, eu preciso que você guarde tudo isso que você ouviu com você. Ninguém pode saber a verdade sobre a Mariana, por favor, eu lhe imploro!
VITÓRIA – Calma, Juliana. Eu nunca contaria uma coisa dessas sem a sua permissão. É um segredo seu. Um segredo seu e da Mariana, mas eu não consigo entender qual a sua relação com a Carminha e o Jamil nessa história toda.
JULIANA BAIXA OS OLHOS.
JULIANA – Vitória, eu passei alguns anos fora.
VITÓRIA – Sim, nos Estados Unidos, todo mundo já sabe.
JULIANA ENCARA VITÓRIA, COM OS OLHOS MAREJADOS.
JULIANA – Não. Isso tudo sobre ter morado fora, tudo isso é uma mentira!
VITÓRIA – Como assim, uma mentira?
JULIANA – Vitória, eu errei muito no passado. Eu fui presa e paguei pelo crime que eu cometi. Eu fiquei presa durante quinze anos da minha vida.
VITÓRIA BOQUIABERTA. JULIANA DEIXA CAIR GROSSAS LÁGRIMAS.
JULIANA – Eu voltei porque eu preciso reconquistar o amor da minha filha. Pedi ajuda ao Jamil, eu não conhecia a Carminha. O Jamil era meu vizinho, meu e da Amanda no subúrbio quando éramos crianças. Ele era a única pessoa que eu sempre contei e foi à ele que eu recorri nesse momento de dificuldade.
VITÓRIA – Agora eu entendo.
JULIANA – Por favor, eu preciso que você jure que nunca vai contar nada disso ao seu Alberico, à dona Fátima, e muito menos à Áurea ou outra pessoa. Por favor.
VITÓRIA – Eu prometo Juliana. Eu juro! Ninguém vai saber de nada. Não da minha boca!
JULIANA ABRAÇA VITÓRIA, INSTANTANEAMENTE.
JULIANA – Obrigada. Obrigada de verdade.
VITÓRIA – Mas Juliana, uma coisa eu tenho que concordar com o que você disse para o Jamil.
JULIANA – Sobre o que?
VITÓRIA – O fato que a Mariana não iria te aceitar como mãe.
JULIANA FICA SURPRESA E ENTRISTECIDA.
VITÓRIA – Eu conheço a Mariana. Eu sou recepcionista na academia que ela freqüenta e eu já tive inclusive alguns atritos com ela. Eu sei como a Mariana é e ela não te aceitaria sabendo da sua condição social e nem o fato que você é uma ex-presidiária.
JULIANA BAIXA OS OLHOS, TRISTE.
VITÓRIA – Quer um conselho? Sonde o terreno com calma. É difícil ouvir uma coisa dessas, ainda mais sobre uma filha, mas a Mariana não te aceitaria. Ela é mimada, é egoísta. A Mariana é esnobe!
JULIANA – É... A Amanda já havia me alertado sobre isso.
VITÓRIA – Por isso mesmo. Vá com calma e não seja tão otimista quanto à ela.
JULIANA CONCORDA. NAS DUAS.
CORTA PARA ÁUREA E EDGAR. ELE EM SEGUNDO PLANO, VENDO VITÓRIA E JULIANA CONVERSANDO, SOBRE SEU PV. ÁUREA SE APROXIMA DELE.
ÁUREA – Quem vê você olhando assim para a vagabunda da Juliana, pensaria que eu sou uma trouxa eu te aceitar ainda.
EDGAR – (Irritado) Eu não estou olhando a Juliana, você é louca!
ÁUREA – Então está olhando a Vitória? Por favor, Edgar, eu não sou idiota!
EDGAR – Pelo contrário, você é uma completa idiota!
ÁUREA – Como é que é?
EDGAR ENCARA ÁUREA.
EDGAR – Porque você não monta numa tartaruga e vai se ferrar bem devagar, hein, Áurea?
EDGAR SAI, DEIXANDO ÁUREA ARRASADA. CORTA PARA INÊS E ALBERICO.
ALBERICO – Você parece triste, minha neta. É pelo término do seu relacionamento com o Raulzinho?
INÊS – Mais ou menos, vô. É claro que satisfeita com o término eu não estou. Não posso dizer que foi um alívio, sempre acaba sendo um incômodo. A nossa relação durou anos, mas não é só isso.
ALBERICO – Conta pra mim. Eu sou seu avô. O seu único avô vivo. Então pode se abrir, confiar.
INÊS – Se eu te contar, o senhor promete que vai guardar segredo?
ALBERICO – É claro, meu amor. Pode confiar qualquer coisa à mim.
INÊS RESPIRA FUNDO E ENCARA ALBERICO.
INÊS – Eu flagrei o meu pai com a secretária. A secretária é amante do seu Edgar.
REAÇÃO DE ALBERICO. CÂM CORTA PARA FÁTIMA CONVERSANDO COM PAULINA.
PAULINA – Muito bonito o presente que o Conrado deu pra você.
FÁTIMA – Não começa, Paulina. O Conrado deu o presente em agradecimento à hospitalidade, você mesmo ouviu. Todo mundo ouviu!
PAULINA – Acho bom que todos acreditem nisso mesmo, dona Fátima. Não quero jogar areia no olho de ninguém, mas o povo malda.
FÁTIMA PENSATIVA. CONRADO SE APROXIMA DAS DUAS.
CONRADO – Fátima!
FÁTIMA O ENCARA NERVOSA.
CONRADO – Eu vim me despedir.
FÁTIMA – Ué, mas já? Não vai esperar pela Ceia?
CONRADO – Eu preciso ir mesmo. Não estou muito disposto, trabalhei um pouco mais do que devia. Vim mesmo só para marcar presença e entregar o seu presente.
FÁTIMA – Eu agradeço e lamento a sua ausência.
CONRADO – Lamenta de verdade?
ELE LANÇA UM OLHAR PARA ELA, QUE SE INTIMIDA.
FÁTIMA – Claro. Quem lamentaria muito também é a Guida. Ela tinha planos essa noite.
CONRADO RI.
CONRADO – A Guida tem esperanças demais, tem ilusões demais. Amanhã eu falo com ela.
FÁTIMA – Mas não é bom ela ter ilusões se as suas intenções com ela não forem compatíveis.
CONRADO – Eu nunca a enganei. Nunca disse que era ela a mulher do qual eu estou interessado.
CONRADO SE APROXIMA. FÁTIMA MUITO NERVOSA.
FÁTIMA – Acho bom então você ir.
CONRADO – Obrigado pela noite e pelo presente.
FÁTIMA – Pelo presente? Mas eu que tenho que agradecer. Você quem me trouxe algo, eu não te dei nada.
CONRADO – Deu sim. Deu muito mais do que você imagina.
CONRADO SE APROXIMA DELA E LHE DÁ UM BEIJO NO ROSTO, EM SEGUNDO PLANO, ÁUREA REGISTRA O MOMENTO.
CONRADO – (Se afastando) Obrigado.
ELE SORRI E SAI. FÁTIMA NERVOSA, SE VIRA, OFEGANTE. PAULINA AO SEU LADO.
PAULINA – Continua virada, dona Fátima.
FÁTIMA – O que?
PAULINA – Se alguém ver o seu rosto nesse momento, vai comprovar o mesmo pensamento que eu tenho sobre essa história toda: O de que não vai terminar nada bem.
FÁTIMA ENCARA PAULINA, QUE CONFIRMA.
CÂM VOLTA PARA ALBERICO E INÊS.
ALBERICO – Isso o que você tá me contando é...
INÊS – Eu sei vô, isso tudo é nojento. É desprezível, mas eu não quero que a minha mãe descubra nada disso.
ALBERICO – Mas não contarmos para sua mãe também é uma traição, Inês.
INÊS – Você prometeu, vô. Prometeu que não contaria nada.
ALBERICO – (Titubeia) Tudo bem, eu não vou contar. Mas eu vou ter uma séria conversa com o Edgar.
INÊS – Também não, seu Alberico! Eu não quero ser a semente da discórdia do casamento entre os dois! Não quero ver minha mãe sofrendo. Ela se agarrou à esse relacionamento como uma válvula de escape, o senhor não vê?
ALBERICO – Mas isso é doentio, minha filha.
INÊS – Eu sei, mas quem somos nós para julgá-la? Eu contei porque confio no senhor e tava cheia de guardar isso pra mim. Tava me sufocando, mas eu não quero que o senhor fale com nenhum dos dois.
ALBERICO CONCORDA, À CONTRAGOSTO. INÊS ABRAÇA ALBERICO, QUE OLHA EDGAR COM NOJO. OS DOIS TROCAM OLHARES.
CORTA PARA:

CENA 05. APARTAMENTO DE ALBERICO. SALA DE REFEIÇÕES. INTERIOR. NOITE
CÂM ABRE NA CEIA DA FAMÍLIA, VISTA EM ÂNGULO SUPERIOR. MESA CHEIA, COM O PERU NO MEIO E VÁRIAS TRAVESSAS DE COMIDAS NATALINAS. MESA JÁ POSTA. ABRE EM PLANO GERAL: ALBERICO À CABECEIRA DA MESA, TODOS EM VOLTA.
ALBERICO – Eu quero dizer algumas palavrinhas antes de começarmos a nossa maravilhosa Ceia desse ano.
TODOS MUITO ATENTOS ÀS PALAVRAS.
ALBERICO – Eu sei que falar de amor nessa época do ano é muito clichê, mas muitos são aqueles que falam de amor, mas poucos que realmente sabem o significado dessa palavra. Não só na data de hoje, mas sempre, sempre o amor teria que ser uma obrigação na vida de todos nós.
CÂM VAI PEGANDO UM A UM, DURANTE O DISCURSO DE ALBERICO.
ALBERICO – (V.O) A base de uma família, de uma amizade, de um relacionamento, seja ele do tipo que for, com as pessoas que forem tudo isso não existe sem a confiança, a lealdade e o amor. Foi esse sentimento que nos reuniu aqui hoje, que nos fez sairmos de nossas casas e nos juntarmos às pessoas queridas. E nem sempre esse amor, essa gratidão vem de pessoas do nosso sangue, e sim de pessoas que chegam em nossas vidas de forma surpreendente. Esse é o caso da nossa querida Juliana.
CÂM FOCA EM JULIANA, QUE SORRI, EMOCIONADA.
ALBERICO – Sem essa moça nada disso, nada do que tem aqui em cima dessa mesa hoje à noite seria possível.
ALBERICO ABRAÇA JULIANA.
ALBERICO – Eu quero pedir um brinde á Juliana, que fez essa noite possível. Que fez o nosso Natal melhor e possível.
TODOS ERGUEM SUAS TAÇAS. ÁUREA MUITO CONTRARIADA, ERGUE À MEIA. JULIANA SORRI EMOCIONADA.
ALBERICO – (Voz baixa) Minha filha.
JULIANA – Obrigada, seu Alberico.
OS DOIS SE ABRAÇAM. TODOS BRINDAM, DEPOIS APLAUDEM. JULIANA AGRADECE, UMA LÁGRIMA CAI SOBRE O ROSTO. ELA SORRI.
CORTA PARA:

CENA 06. HARAS DONA CAROLINA. CASA GRANDE. SALA. INTERIOR. NOITE
A EMPREGADA ENTRA NO RECINTO E FALA COM CELINA EM OFF, INSTANTES E ELA SE VOLTA PARA OS PRESENTES.
CELINA – Pessoal, a Ceia já está disposta à mesa, vamos?
TODOS SE LEVANTAM. BRUNO E MARIANA SAEM JUNTOS. FRANKLIN TROCA OLHARES COM FERNANDA, ABRINDO CAMINHO PÁRA A VETERINÁRIA, CELINA REGISTRA O MOMENTO. CELINA E AMANDA UMA AO LADO DA OUTRA.
AMANDA – Certeza que esta Ceia está divina, querida.
CELINA – Tenha certeza que sim, Amanda.
AMANDA SORRI E VAI COM DANTE. A EMPREGADA LOGO ALCANÇA CELINA.
EMPREGADA – Dona Celina, há uma pessoa querendo falar urgentemente com a senhora ao telefone.
CELINA – Logo agora? Que inconveniente.
CELINA BUFA E PEGA O TELEFONE DAS MÃOS DA EMPREGADA.
FRANKLIN – Celina? Você não vem?
CELINA – Só um momento. Podem começar a Ceia sem mim, eu já chego.
FRANKLIN CONCORDA. CELINA SE VIRA PARA O JANELÃO DE VIDRO, FICANDO SOZINHA NA SALA.
CELINA – (Tel.) Alô?!
OTÁVIO – (Off) Dona Celina, aqui é o Otávio.
CELINA – (Tel.) Otávio?
OTÁVIO – (Off) Seu ex-administrador.
CELINA – (Tel./ Revira os olhos) Que deselegante da sua parte ligar à essa hora, Otávio. Ainda mais após ter se demitido em pleno dia de Natal, nos deixando na mão.
OTÁVIO – (Off) Eu tenho uma explicação pra isso tudo, dona Celina. Eu preciso que a senhora cheque o seu email agora. Eu mandei um pequeno presente de Natal. Aposto que a senhora vai achar bastante interessante.
CELINA – (Tel.) Escuta aqui, eu não tenho tempo pra checar email nesse momento. Há uma ceia aqui em casa./
OTÁVIO – (Off/ Corta) Eu sei. Eu sei disso tudo e aposto que a Fernanda está aí. Acertei?
CELINA FICA PASMA, EM SILÊNCIO. UMA GARGALHADA É OUVIDA DO OUTRO LADO DA LINHA. TENSÃO.
CELINA – (Tel.) Como você...
OTÁVIO – (Off) Como eu sei? A senhora já percebeu que para o doutor Franklin, a Fernanda não é uma simples veterinária. Ela é muito mais que isso.
CELINA – (Tel/ Nervosa) Seja explicito!
OTÁVIO – (Off) Já disse. Abra seu email. Lá tem um presentinho pra senhora. Agora boa noite e feliz Natal, dona Celina.
CELINA – (Tel.) Otávio!
OTÁVIO JÁ DESLIGOU. CELINA DESLIGA O TELEFONE, NERVOSA. CELINA BUSCA NO CELULAR SEU EMAIL. ELA ACESSA. FREEZE NA TELA: AS FOTOS QUE OTÁVIO TIROU DE FERNANDA E FRANKLIN AOS BEIJOS, NA ALA DOS EMPREGADOS. CÂM BUSCA REAÇÃO DE CELINA, NERVOSA. ELA PASSA A MÃO PELOS CABELOS.
INSTANTES. A EXPRESSÃO DE CELINA MUDA E ELA FICA FRIA, COM OS OLHOS RESSECADOS.
CORTA PARA:

CENA 07. HARAS DONA CAROLINA. CASA GRANDE. SALA DE REFIÇÕES. INTERIOR. NOITE
À CABECEIRA ESTÁ FRANKLIN. MESA POSTA, CHEIA DE COISAS GOSTOSAS. AMANDA E DANTE LADO A LADO, BRUNO E MARIANA, CADÚ E HENRIQUE, FERNANDA MAIS AFASTADA, AO LADO DE MARIANA E BRUNO.
FRANKLIN – É com orgulho que reúno em mais um Natal os meus amigos e as nossas famílias. É sempre um prazer tê-los aqui.
AMANDA – E Celina? Não vem para a Ceia?
FRANKLIN – Está ao telefone. Ela não demora.
CELINA ENTRA NESSE MOMENTO, FRIA, APARENTEMENTE CALMA.
DANTE – Aí está ela.
FRANKLIN DEIXA A CABECEIRA PARA CELINA E INDICA.
FRANKLIN – Venha, querida. Sente-se aqui. Hoje o lugar de destaque é seu.
CELINA ENCARA À TODOS E DEPOIS FRANKLIN. CADÚ E BRUNO SE ENTREOLHAM, ESTRANHAMENTE.
CELINA – O lugar de destaque na mesa, Franklin? Que gentil da sua parte.
FRANKLIN – Você tá estranha.
CELINA – Você sabe quem estava comigo ao telefone agora?
FRANKLIN FAZ QUE NÃO ENTENDE E SORRI PARA OS CONVIDADOS.
FRANKLIN – Meu amor, não é hora pra isso.
CELINA – (Tom) Meu amor?
CELINA COMEÇA A RIR. AS PESSOAS COMEÇAM A SE OLHAR, INCOMODADAS.
CELINA – Acho que você anda trocando de amores muito fácil, Franklin.
FRANKLIN – Celina, por favor.
CELINA JOGA UM PRATO NO CHÃO. CADÚ SE LEVANTA.
CADÚ – Mãe, o que é que tá acontecendo?
CELINA – (Berra) O desgraçado do seu pai! O desgraçado do seu pai tá me traindo!
REAÇÃO DE AMANDA E DANTE. HENRIQUE E MARIANA TAMBÉM.
BRUNO – (Se levanta) Mãe, para com isso!
CELINA VAI ATÉ FERNANDA E A PEGA PELOS CABELOS.
CELINA – Traindo com essa vagabunda aqui!
FERNANDA – (Grita) Me solta, sua louca!
CELINA JOGA FERNANDA NO CHÃO. FRANKLIN CORRE PARA SEGURÁ-LA.
CELINA – (Berra) Não me segura, seu ordinário!
AMANDA COCHICHA COM DANTE.
AMANDA – Meu Deus, mas isso aqui tá impagável!
AMANDA DÁ UMA RISADINHA. BRUNO OLHA COM DESDÉM PARA ELA.
MARIANA – Mãe, pelo amor de Deus!
AMANDA FAZ ZÍPER NA BOCA. DANTE E HENRIQUE SE ENTREOLHAM, NERVOSOS.
CELINA – (Entre o choro) Eu sabia que você tava me traindo. Eu já sabia disso, mas eu não imaginava que fosse com alguém debaixo do meu nariz!
FERNANDA CHORA, ENCARANDO CELINA, COM VERGONHA.
CELINA – (Tom forte) Com essa infeliz!
CELINA CHUTA AS PERNAS DE FERNANDA. FRANKLIN A AFASTA, FICANDO EM SUA FRENTE.
FRANKLIN – (Raiva/ Tom) Para com isso! Vamos subir agora! A festa acabou!
CELINA CHORA, DIANTE DE FRANKLIN. ELE SE SOLTA E SE VIRA PARA FERNANDA. TENSÃO. EM SLOW-MOTION: CELINA OLHA PARA OS CONVIDADOS. AMANDA SEGURANDO O RISO, O RESTANTE TODO CHOCADO. CELINA OLHA PARA A MESA. RAPIDAMENTE PEGA UM FACA PONTIAGUDA.
CADÚ – (Grita) Não, mãe!
CÂM NORMAL: FRANKLIN SE VIRA E CELINA ENFIA A FACA NA BARRIGA DELE. FRANKLIN ARREGALA OS OLHOS. CELINA METE A FACA MAIS FUNDO NELE.
SLOW-MOTION: CÂM BUSCA A REAÇÃO DE TODOS OS PRESENTES. MARIANA COLOCA A MÃO SOBRE A BOCA. BRUNO E CADÚ, DESESPERADOS.
FERNANDA SE LEVANTA, CHOCADA. CELINA ENCARA FRANKLIN, ENQUANTO SEGURA A FACA, JÁ SUJA DE SANGUE. CLOSES ALTERNADOS. EM CELINA, FORA DE SI.
CORTA PARA:
EFEITO FINAL: A TELA CONGELA EM EFEITO VITRAL.
FIM DO CAPÍTULO 1

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