segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Capítulo 03: Castelo de Cartas


CENA 01/EXT./RIO DE JANEIRO/RUA/NOITE
Continuação imediata do capítulo anterior.
    Fernanda e o motorista saem do carro e veem a moça atropelada.
MOTORISTA – Viu, dona Fernanda. Eu disse que era melhor a gente esperar o sinal abrir.
FERNANDA – Cala a boca! Agora eu tenho que corrigir isso. Liga pra ambulância.
    O motorista obedece.
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CENA 02/EXT./MANSÃO TRINDADE/JARDIM/NOITE
    Madalena não sabe o que dizer para Kátia Flávia.
KÁTIA FLÁVIA – Anda, Madalena, desembucha! O que você e a dona Ingrid estão escondendo?
MADALENA – Desculpa, mas você não tem nenhum direito de saber. Agora com licença que eu preciso terminar meu serviço.
    Madalena entra na mansão.
KÁTIA FLÁVIA – Aí tem... o que será que elas estão armando?
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CENA 03/INT./CASA DE ARTURO/SALA/NOITE
    Arturo e Sandra assistem a um programa de comédia e dão altas risadas.
ARTURO – Ora, mas que paspalho esse cara! Hahaha!
SANDRA – Eu sempre morro de rir com esse programa. Eu não sabia que o senhor gostava.
ARTURO – Nem eu. Foi você quem colocou nesse canal.
    Os dois riem. Nenê chega.
NENÊ – Ih, tô vendo que vocês se divertiram, né?
ARTURO – Com certeza, minha filha.
SANDRA – O seu pai tem muito bom-humor, Nenê. Essa foi uma das noites mais divertidas da minha vida.
NENÊ – É, tô vendo. Bom, você já pode ir pra casa, Sandra. Obrigada!
ARTURO – O quê? A Sandra já vai?
SANDRA – É, seu Arturo, tudo que é bom dura pouco. Mas amanhã eu volto, né Nenê?
NENÊ – Com certeza! Tchau, querida.
    As duas se beijam no rosto e Sandra vai embora.
NENÊ – Bom, papai, eu vou tomar um banho, tá?
    Nenê vai para o banheiro.
ARTURO – E como sempre eu fico aqui sozinho nessa sala. Bem que a Nenê podia se atrasar. Poderia até rolar alguma coisa entre eu e a Sandra. Droga!
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CENA 04/INT./HOSPITAL/SALA DE ESPERA/NOITE
    Algumas pessoas estão sentadas nos bancos da sala de espera do hospital. Enfermeiros chegam com Vitória desacordada em uma maca, acompanhada por Maria Fernanda.
MARIA FERNANDA – Vocês podem me dizer se ela morreu, desmaiou... afinal, o que aconteceu com ela?
    Os enfermeiros não respondem e levam Vitória para o quarto.
MARIA FERNANDA – Pobre é um bicho ignorante mesmo. Nem responder uma pergunta eles respondem. Ah, mas sabe de uma coisa? Eu quero é que essa garota se exploda, nem conheço a fulana. Aliás, eu nem sei o que eu tô fazendo nesse hospital, bancando a preocupada.
LUCAS – Falando sozinha, mamãe?
    Maria Fernanda se surpreende com a presença do filho.
MARIA FERNANDA – Lucas? Como você adivinhou que eu tava aqui no hospital?
LUCAS – Eu não adivinhei nada. O motorista me ligou e falou o que aconteceu.
MARIA FERNANDA (murmura) – Filho da mãe.
LUCAS – E a moça que você atropelou? Ela tá bem? Corre risco de vida?
MARIA FERNANDA – Lucas, em primeiro lugar eu não atropelei ninguém; quem atropelou foi o irresponsável do Adamastor, que continuou dirigindo mesmo com o sinal vermelho. E eu não sei como é que a menina ficou, porque os enfermeiros daqui me ignoraram como se eu fosse uma pedra. Só podia ser pobre...
LUCAS – Mamãe!
MARIA FERNANDA – Tô mentindo?
LUCAS – Eu vou ali na balconista ver se eu arranjo alguma informação de pelo menos quem é a garota. Aliás, você conhece ela?
MARIA FERNANDA – Não sei, ela tava caída no chão de costas, nem deu pra ver o rosto da coitada.
    Lucas vai até a balconista e conversa.
MARIA FERNANDA (pensa) – Nem com a namorada dele ele tem todo esse cuidado, agora tá preocupado com uma infeliz que eu atropelei. Esse menino não se valoriza mesmo...
    Lucas volta.
LUCAS – Mamãe, a balconista disse que nós só podemos visitar a moça amanhã, quando ela já vai estar com os aparelhos e tudo.
MARIA FERNANDA – Eu não acredito, Lucas. Você quer ver a moça? Pra quê?
LUCAS – Mamãe, assuma sua responsabilidade! Você atropelou ela e tem que conhecer ela, pra começar.
MARIA FERNANDA – Pra começar? O que você quer dizer com isso, Lucas?
LUCAS – Ora, é você quem tem que arcar com as despesas dela enquanto ela estiver internada.
MARIA FERNANDA – Pronto. Agora eu tô feita.
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CENA 05/EXT./RIO DE JANEIRO/PONTOS/NOITE-DIA
    (Sonoplastia: Gaveta – Fernando e Sorocaba)
    Amanhece no Rio de Janeiro. Pessoas passeiam, tiram fotos, visitam o Cristo Redentor, se divertem na praia.
    (Sonoplastia: Fade Out – Gaveta)
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CENA 06/INT./MANSÃO TRINDADE/SALA/DIA
    Maria Fernanda está sentada no sofá da sala, vendo TV ao lado de Kátia Flávia. Ingrid e Otávio chegam.
KÁTIA FLÁVIA – Passaram a noite fora, é?
OTÁVIO – Não, imagina. A gente saiu cedo pra capinar o jardim e estamos voltando agora.
KÁTIA FLÁVIA – Ai, que grosseria. Só fiz uma pergunta.
INGRID – Nenhum de nós lhe deve satisfações, mas já que você está tão curiosa... sim, nós passamos a noite fora. E transamos!
MARIA FERNANDA – Como diria uma vilã que eu adoro e até acho muito parecida comigo... que velha safada!
OTÁVIO – Ué, o que tem de mal? A moça tá com tanta curiosidade. Kátia Flávia, nós somos velhos mas não somos bestas. Existe uma pílula pra isso.
INGRID – Exatamente. E funciona bem. Com licença.
    Os dois sobem as escadas.
KÁTIA FLÁVIA – Cê viu isso, sogrinha? Isso me lembrou uma novela. Aquela do Félix, lembra?
MARIA FERNANDA – Não me chama de sogrinha que isso é tratamento pra velho. Tipo esses dois velhos sem-vergonha aí.
KÁTIA FLÁVIA – Calma, desculpa, não te chamo mais assim! Olha, Maria Fernanda, eu reparei que eles nem sequer olharam na sua cara. Tá tudo bem entre vocês?
MARIA FERNANDA – Besteira deles, querem misturar pobre com os negócios da empresa. Um absurdo! Mas o que é que eu tô fazendo de dando satisfação? Ah, eu tenho mais o que fazer.
    Maria Fernanda vai para fora de casa.
KÁTIA FLÁVIA – Ai, que família estressada. Eu, hein. Tomara que não seja contagioso, porque se for todo mundo aqui pega uma bela duma depressão. Clima pesado, Deus me livre.
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CENA 07/EXT./HOSPITAL/FRENTE/DIA
    (Sonoplastia: Kátia Flávia – Fausto Fawcett)
    Alguns carros estacionam em frente a um grande hospital. Uma ambulância chega com uma maca. Alguns enfermeiros caminham pelos jardins.
    (Sonoplastia: Fade Out – Kátia Flávia)
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CENA 08/INT./HOSPITAL/QUARTO/DIA
    Vitória está adormecida na cama do hospital. O aparelho dá um ‘bipe’ a cada segundo.
    A moça lembra de quando foi resgatada por Lucas na praia e sorri.
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CENA 09/INT./MANSÃO TRINDADE/SALA/DIA
    Kátia Flávia continua sentada no sofá. Lucas desce as escadas.
LUCAS – Kátia Flávia, você viu a minha mãe? A gente marcou de ir no hospital hoje.
KÁTIA FLÁVIA – Ela saiu agorinha, dizendo que tinha uma coisa muito importante pra fazer. Ô Lucas, o que vocês vão fazer no hospital?
LUCAS – Obrigado, Kátia Flávia. Até depois.
    Lucas sai.
KÁTIA FLÁVIA – Nossa, não me dá nem um obrigado, nem um beijinho, nem nada. Deus me livre!
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CENA 10/INT./HOSPITAL/QUARTO/DIA
    Vitória continua adormecida. O médico chega ao quarto acompanhado de Maria Fernanda.
MÉDICO – Aí está ela. Eu vou resolver uns problemas e vou deixar a senhora à vontade.
    O médico sai. Maria Fernanda olha Vitória, surpresa.
MARIA FERNANDA – Eu só posso estar sonhando... Vitória Vasconcelos? Não, não, não pode ser. Você tá delirando, Maria Fernanda!
    Vitória acorda.
VITÓRIA – Onde eu tô? O que aconteceu?
    Maria Fernanda observa a moça, assustada.
VITÓRIA – Você?
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CENA 11/INT./SHOPPING/INTERIOR/DIA
    (Sonoplastia: Le Freak – Chic)
    Rosicler faz compras no shopping. Ela entra em cada loja para comprar roupas, acessórios, sapatos e etc.
    Ela prova várias roupas. Primeiro, um vestido longo verde. Depois um macacão vermelho. Logo após, uma camisa amarela com uma calça jeans. Depois, a senhora caminha com um salto branco, uma sandália, um salto de plataforma vermelho.
    Ao final, leva tudo em várias sacolas e sai do shopping animada.
    (Sonoplastia: Fade Out – Le Freak)
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CENA 12/INT./MANSÃO TRINDADE/QUARTO INGRID/DIA
    Ingrid está sentada na cama. Otávio observa o dia pela janela.
INGRID – O que é que você tanto olha por essa janela, Otávio?
OTÁVIO – O que a nossa filha está perdendo.
INGRID – Seja mais claro.
OTÁVIO – O mundo, Ingrid. Maria Fernanda com toda a sua arrogância e desumanidade está perdendo o mundo que pode proporcionar milhões de coisas a ela.
INGRID – Isso é verdade, querido. Nós colocamos ela nas melhores escolas, demos a ela as melhores oportunidade, com um único objetivo: torna-la uma cidadã de bem, honesta.
OTÁVIO – E agora olha o que ela se tornou. Um monstro!
INGRID – Calma, meu querido.
OTÁVIO – Nós erramos no mimo que demos a ela. Agora ela se acha dona do mundo, pode fazer o que bem entende, tratar as pessoas como quiser... como ela pode ter o meu sangue?
    Ingrid desmaia. Otávio tenta levantar a mulher.
OTÁVIO – Ingrid! Querida, acorda! Socorro! Madalena, me ajuda aqui!
    Madalena chega correndo ao quarto.
MADALENA – Jesus amado, o que aconteceu com a dona Ingrid?
OTÁVIO – Deve ter tido uma queda de pressão. Nós estávamos conversando e de repente ela desmaiou. Vamos, me ajude.
    Os dois levantam Ingrid e a põem na cama.
OTÁVIO – Chame um médico! Rápido!
MADALENA – Sim, senhor.
    Madalena disca um número no telefone que está no criado-mudo.
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CENA 13/INT./HOSPITAL/QUARTO/DIA
    Maria Fernanda e Vitória estão assustadas.
VITÓRIA – Maria Fernanda? O que você tá fazendo aqui?
    Maria Fernanda não responde. A mulher tem lembranças turvas. Brigas, gritos, choro, e dois tiros.
MARIA FERNANDA (pensa) – Como é possível?
VITÓRIA – Eu falei com você. O que você tá fazendo aqui?
MARIA FERNANDA – Vitória, eu...
    Nesse momento, Lucas chega.
LUCAS – Mamãe, por que você veio sozinha? Eu disse que era pra nós virmos juntos.
    Silêncio. Lucas olha para Vitória.
LUCAS – Vitória?
VITÓRIA – Lucas?
MARIA FERNANDA – Vocês se conhecem?
LUCAS – Sim, mamãe. Essa moça se afogou no mar e eu salvei ela.
VITÓRIA – E até hoje eu sou grata por isso. Maria Fernanda, não vai dizer que ele é seu filho.
MARIA FERNANDA – Sim, ele é.
LUCAS – Mamãe, o que você tem? Sua voz tá trêmula, você parece assustada. O que aconteceu?
MARIA FERNANDA – Não, nada... eu... eu vou ao toilet. Com licença.
    Maria Fernanda sai do quarto.
    Corta para:
CENA 14/INT./HOSPITAL/CORREDOR/DIA
    Maria Fernanda está ofegante.
MARIA FERNANDA – Não pode ser. Isso não está acontecendo...
    Maria Fernanda novamente tem lembranças de gritos, lágrimas e tiros.
MARIA FERNANDA – Essa moça não pode conviver com o meu filho. Vitória Vasconcelos não pode conviver com ninguém da minha família!
    Kátia Flávia chega.
KÁTIA FLÁVIA – Falando sozinha, honey?
MARIA FERNANDA – O que você tá fazendo aqui, encosto?
KÁTIA FLÁVIA – Ai, isso é jeito de se tratar uma nora? Eu vim na maior boa vontade te dar um recado, mas já que você não quer...
MARIA FERNANDA – Não, espera aí. Que recado?
    Kátia Flávia ouve a voz de Lucas.
KÁTIA FLÁVIA – O Lucas tá nesse quarto? Com quem ele tá conversando?
    A moça entra no quarto e se depara com Vitória.
KÁTIA FLÁVIA – Oi? Essa sem-sal de novo? O que você tá fazendo com ela, Lucas?
LUCAS – Kátia Flávia, você...
KÁTIA FLÁVIA (interrompe) – O que foi que aconteceu dessa vez, bebê? Ralou o joelho e chamou meu noivo, foi isso?
LUCAS – Para, Kátia Flávia. Minha mãe atropelou a Vitória e nós viemos aqui prestar uma ajuda.
VITÓRIA – Ela me atropelou?
    Maria Fernanda entra.
MARIA FERNANDA – Pera lá! Eu já disse que eu não atropelei ninguém. Foi o irresponsável do Adamastor, entenderam?
KÁTIA FLÁVIA – Então a Vitória Palmatória se aproveitou desse acidente pra arrastar asa pra cima de você, foi isso?
VITÓRIA – Escuta aqui, você está me ofendendo. Eu não tenho culpa de que coincidentemente eu tenha sido atropelada pela mãe do Lucas.
MARIA FERNANDA – Quantas vezes eu vou ter que falar que eu não atropelei ninguém?
LUCAS – Kátia Flávia, por favor, dá licença.
KÁTIA FLÁVIA – Eu vou embora então, mas vocês vão ficar sem saber do que aconteceu lá na mansão.
MARIA FERNANDA – Fala logo, peste bubônica. Para de fazer suspense.
KÁTIA FLÁVIA – A dona Ingrid desmaiou. Sei lá, ela teve uma queda de pressão, ao que parece.
LUCAS – Como assim? Eu vou lá agora mesmo. Mamãe, fica com a Vitória que eu já volto. Vamo, Kátia Flávia.
    Lucas e Kátia Flávia saem, deixando Maria Fernanda e Vitória sozinhas.
MARIA FERNANDA (pensa) – Que ótima oportunidade pra matar essa garota e acabar de uma vez por todas com a família Vasconcelos.
    Maria Fernanda olha para os aparelhos.
VITÓRIA – Então, dona Fernanda...
MARIA FERNANDA (interrompe) – Dona não, isso é coisa pra velho.
VITÓRIA – Ah, desculpa. Fernanda, eu...
MARIA FERNANDA (interrompe) – Que insolência! Cadê o seu respeito?
VITÓRIA – Ué, se eu não posso te chamar de dona nem só de Fernanda, do que eu posso te chamar?
MARIA FERNANDA – Que tal de carrasco?
    Maria Fernanda desliga os aparelhos de Vitória. Vários bipes começam a ecoar pelo quarto. Fernanda esboça um sorriso.


FIM DO CAPÍTULO


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