EPISÓDIO 7: QUARENTENA –
PARTE 1
CENA 01: STOCK SHOTS. DIA.
EXT. PRAIA DE COPACABANA / ICARAÍ.
O
sol está forte. A CAM sobrevoa a praia de Copacabana (Rio de Janeiro) até a
praia de Icaraí (Niterói), separadas apenas pela Baía de Guanabara. Em Icaraí,
há várias pessoas, se banhando e praticando esportes na areia.
SONOPLASTIA: Cheap
Thrills – Sia
Corta
para:
CENA 02:
APARTAMENTO 102, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Pedro
assistindo televisão na sala. Sarah tomando café da manhã, Flávio espirrando.
Sonoplastia
cessa.
SARAH – Mas você
tem mesmo que viajar agora, meu amor? Logo hoje que você amanheceu com essa
gripe horrorosa!
FLÁVIO – É uma
viagem inadiável, meu bem, não dá pra deixar de ir. E eu só tô resfriado, não é
nada importante.
SARAH – Pois eu
não gosto nada da ideia de você sair por aí desse jeito. Mas tudo bem, você é
mesmo cabeça dura!
Flávio espirra. Vai beijar Sarah, que afasta.
SARAH– Nada
pessoal. Mantenha seus vírus longe de mim, benzinho.
Flávio ri. Manda um beijo pra ela, com as
mãos. Vai até o filho, na sala.
PEDRO – Você vai
embora de novo, papai?
FLÁVIO – Hey! Eu
não vou embora, só vou dar uma volta. Trabalhando, entende? Mas eu volto logo.
Bate aqui, filhão!
Eles se cumprimentam. Flávio sai do apartamento.
Sarah meio preocupada.
Corta para:
CENA 03:
APARTAMENTO 1003, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
SONOPLASTIA:
Tim Tim – Wesley Safadão
Bozena
animada, limpando a sala. O som alto, toca Wesley Safadão. Márcia sai do
quarto, semblante fechado, vai até a estante e desliga o aparelho.
Sonoplastia
cessa.
BOZENA– Mas é
mesmo uma cavala! Não vê que eu tava ouvindo a música, daí?
Márcia
começa a falar, mas voz nenhuma sai de sua boca. Ela põe a mão na garganta,
tenta dizer algo, mas não consegue.
BOZENA– Que foi?
É brincadeira do silêncio, é?
Márcia vai
até Bozena. Gesticula, aponta para a garganta e faz sinal de negativo.
BOZENA – A
senhora tá sem voz? É isso?
Márcia
assente. Ambas vão até o sofá. Márcia espirra.
BOZENA– Ih, dona
Márcia, já vi que a senhora voltou com um daqueles resfriados bravos. E dessa
vez a coisa é séria, ficou até sem voz, daí!
Márcia
concorda, abatida. Começa a tentar murmurar algo, mas não diz nada.
BOZENA – E agora,
como é que a senhora vai fazer pra se comunicar com os outros moradores?
Ambas
refletem por um momento.
BOZENA – Já sei!
A senhora podia escrever cartas, daí!
Márcia
concorda. Pega um papel e uma caneta do armário da sala e começa a escrever. No
fim entrega pra Bozena.
BOZENA – (lendo) Telefone para o médico, sua imbecil. Mas nem doente a senhora deixa
de ser uma cavala, dona Márcia?
Márcia
ameaça berrar, mas não consegue. Bozena ri e pega o telefone.
BOZENA – (tel.) Alô? Doutor Pacheco Prado? É a
Bozena, escrava... Funcionaria da Márcia. É, a anã.
Márcia
fulmina Bozena com o olhar, mas a mesma ignora.
BOZENA– (tel.) Nós precisamos do senhor aqui no
Santa Fátima, com urgência. Sim senhor. Obrigado.
Bozena
desliga o aparelho.
BOZENA – Doutor
Pacheco Prado está a caminho, dona Marcia!
Márcia
sorri.
Corta para:
CENA 04:
APARTAMENTO 510, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Neide
deitava no sofá, assistindo. Larissa varrendo o chão, Guta e Leo correndo pelo
ambiente. Eles passam em frente a televisão.
NEIDE – Será que
vocês não podem deixar essa velha cansada pelo menos um minuto em paz, cacete?
LARISSA - Mãe!
Olha a boca perto das crianças, por favor.
NEIDE - Eu
preciso de sossego e tranquilidade, minha filha! Ou a minha doença vai me
consumir como um palito de fósforo aceso.
LARISSA - No drama
a senhora já é campeã.
Neide faz
careta. Começa a aumentar o volume da televisão. Foco no aparelho: um repórter
com máscara sanitária fala em frente à um hospital.
REPÓRTER - (v.o.) E quando os cientistas do mundo todo se tranquilizavam pela trégua da
epidemia do vírus ebola, uma triste noticia volta a preocupar: a doença voltou
a tona, dessa vez em todo o território africano, e já tem alguns novos casos
registrados em países como Estados Unidos, Alemanha e México. A recomendação da
Organização Mundial da Saúde é de que pessoas vindas desses lugares,
principalmente da África, sejam postas imediatamente em quarentena, evitando
contato com familiares e qualquer tipo de multidão.
Larissa
derruba a vassoura, desesperada. Neide estranha.
NEIDE - Que foi,
minha filha? Algum problema?
LARISSA - Todo
problema, mamãe! O Flávio vem hoje da África, já tá chegando! E se ele pegou
essa doença? Ai, meu Deus do céu!
Neide ri.
NEIDE - Não
esquenta, Larissa, teu marido tem saúde de ferro. Nada acontece com ele!
Flávio
entra, espirrando muito.
FLÁVIO -
Surpresa!
GUTA - Papai!
As crianças
vão abraçar Flávio, mas Larissa grita e impede. Flávio assustado.
LARISSA - Você tá
espirrando, Flávio!
FLÁVIO - Ah, isso
é só uma gripe, meu amor.
LARISSA - Você
veio da África, Flávio! Tá tendo epidemia de ebola lá! E se você contagiar a
gente?
Neide
levanta rápido, fica atrás de Larissa.
NEIDE - Isso
mesmo! É melhor prevenir do que remediar. Venham, crianças!
As crianças
obedecem, cabisbaixas.
FLÁVIO - Mas isso
é totalmente desnecessário! É impossível que eu esteja com ebola.
LARISSA - Você não
estava na África, meu amor?
FLÁVIO - Eu... Eu
tava, claro que eu tava. Eu tava sim. Na África.
NEIDE - Então,
oras. O continente tá numa baita epidemia da doença! Passou na TV agorinha.
Você vai ter que ficar em quarentena!
Larissa
começa a chorar.
LARISSA - Eu não
quero ficar viúva!
Flávio vai
até ela, a abraça.
FLÁVIO - Você não
vai ficar viúva, meu amor. Eu tô ótimo.
Larissa
amolecendo. Percebe que está nos braços dele, grita e corre pro outro lado da
sala. Neide e as crianças seguem.
LARISSA - Não
chega perto de ninguém! Eu vou falar com a dona Márcia, ela vai dar um jeito.
Larissa
começa a discar.
Corta para:
CENA 05:
APARTAMENTO 1003, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Márcia
sentada no sofá, sendo examinada pelo médico. Bozena de pé, acompanhando tudo.
O telefone toca, ela vai atender.
BOZENA - (tel.) Alô? É a Bozena, daí. A dona
Márcia não pode falar no momento. Ela tá gripada, daí. O seu marido também?
Entendi. Olha, eu vou ver aqui o que ela quer que eu faça, e depois eu retorno
pra senhora, pode ser? Tudo bem, daí, até mais.
Bozena
desliga.
BOZENA - E aí,
doutor? Ela vai poder voltar a falar?
DOUTOR PACHECO– Jamais,
Bozena, jamais!
Márciae
Bozena reagem, chocadas. O médico ri.
DOUTOR - Quer
dizer, ela vai, mas vai demorar.
BOZENA - Demorar
quanto, daí?
DOUTOR
PACHECO - Demorar bastante. Dona Márcia, ouça bem: se a senhora fizer
qualquer esforço em suas cordas vocais, elas vão explodir como um saco de carne
moída podre!
Márcia com
os olhos arregalados, aterrorizada. Põe a mão na garganta.
DOUTOR
PACHECO - (grita) Não, não
encosta!
Ela tira a
mão, desesperada.
DOUTOR
PACHECO - Pra sua completa recuperação é bom que você fique imóvel. Não
mexa sequer um músculo, estamos entendidos?
Márcia
assente.
BOZENA - Mas
doutor, e as questões do prédio? A dona Márcia precisa/
O médico se
aproxima de Bozena. Põe o dedo em seus lábios, pedindo silêncio. Bozena com os
olhos arregalados.
DOUTOR
PACHECO - Um saco de carne moída podre explodindo. Vai ser assim se ela
falar.
BOZENA - Isso me
lembra um causo lá de Pato Branco, daí.
DOUTOR
PACHECO - Pato Branco? Que diabo é isso?
BOZENA - Uma cidade, ignorante!
Márcia faz
cara feia. Bozena continua.
BOZENA - Tinha em
Pato Branco uma dona muito faladeira, de nome Sarita Blablabla. A mulher falava
pelos cotovelos, daí! Tinha reputação de mulher mais conversadeira da cidade.
Até que um dia a pobrezinha sofreu um assalto e reagiu. O assaltante, muito
irritado e não aguentando mais a voz de Sarita, enganou a infeliz.
DOUTOR
PACHECO - Nossa! Coitada.
Bozena ri.
BOZENA - Coitada
nada. Ela bem que merecia. Enfim, o assaltante era tão forte que deixou Sarita
sem voz. Arrebentou as cordas vocais da pobre. Ela, que tanto gostava de falar,
havia ficado muda!
DOUTOR
PACHECO - Que fatalidade.
BOZENA - E ela
passou os dias triste e infeliz, se lamentando pelos cantos de Pato Branco. Ela
até criou um ditado popular pra isso, daí.
DOUTOR
PACHECO - E qual é?
BOZENA - Eu não
sei, ela nunca falou.
Márcia levanta,
furiosa, e começa a esbravejar (muda).
BOZENA – Sua
bruta! Deixa eu contar minha história, daí.
DOUTOR
PACHECO - Eu acho melhor não, Bozena. Eu tenho mais pacientes pra
atender.
BOZENA – Mas e a
dona Márcia? E o prédio?
DOUTOR
PACHECO - Bozena, até a recuperação da dona Márcia você está
responsável pelo edifício Santa Fátima.
Márcia vai
protestar, mas desiste. Bozena surpresa.
BOZENA - Eu sou
tipo a sindica substituta, doutor?
DOUTOR
PACHECO - Exatamente.
BOZENA - Bem,
então eu acho bom a gente ir rápido no apartamento da dona Larissa. O senhor me
acompanha? Parece que o esposo dela tá bem doente, daí.
DOUTOR
PACHECO - Claro, claro.
Os dois saem, deixando Márcia sozinha, com o
olhar triste.
Corta para:
CENA 06:
APARTAMENTO 301, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Hortênsia
orando na sala. Lúcio entra com umas sacolas.
HORTÊNSIA - Lúcio,
meu bebê!
LÚCIO - Já
acordada, mãe?
HORTÊNSIA - Mas é
claro. Uma mulher devota acorda cedo pra louvar a Deus.
LÚCIO - Claro.
Vejo que a senhora tá num dia bom. Nada de bebidas, certo?
HORTÊNSIA - Tá
amarrado. Mas e aí, filhote, conseguiu alguma coisa?
LÚCIO - Eu
marquei uma entrevista num postinho ali no Cavalão daqui a pouco, mãe. Se tudo
der certo, eu arrumo um emprego.
Hortênsia
descontente. Lúcio nota.
LÚCIO - Que foi?
Não tá feliz por mim?
HORTÊNSIA - Postinho
no Morro do Cavalão, meu filho? Você merece mais que isso.
LÚCIO - Eu vou
agradecer se conseguir esse emprego, mãe. Pra quem não tem nada tá ótimo.
HORTÊNSIA - É. Mas
eu não me contento ao ver meu lorde tratando criança catarrenta em troco de
migalhas.
Lúcio ri.
Beija ela na testa.
LÚCIO - Bem, eu
já tô indo, mãe. Vê se se comporta, ok?
HORTÊNSIA - Sou uma
mulher santa.
Lúcio sai.
Hortênsia vai até a estante, tira uns livros de lá, e atrás está uma garrafa de
vodka. Hortênsia sorri.
HORTÊNSIA - Essa é
pra comemorar. Só hoje!
Vai beber,
mas antes espirra.
HORTÊNSIA - Acho que
vai me dar gripe. Que se dane!
Hortênsia
começa a beber.
Corta para:
CENA 07:
APARTAMENTO 510, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Larissa,
Neide, Léo e Guta de um lado do apartamento. Flávio do outro, irritado.
FLÁVIO - Isso é
loucura.
LARISSA -
Precaução, bebê. Não dá pra saber que você não tá infectado.
FLÁVIO - Eu não
tô!
LARISSA - Meu
amor, você esteve na África! É claro que existe a chance de você estar
infectado.
NEIDE - Santo
Deus. Perder um genro pra uma doença tão nefasta.
Larissa
começa a chorar. Neide consola.
NEIDE - Calma,
minha filha. Você é jovem. Arruma outro.
FLÁVIO - Ei! Eu
ainda tô vivo!
Flávio
espirra.
NEIDE - Por
enquanto, né?
Neide vai
rir, mas também espirra. Larissa agarra Guta e Léo e sai de perto.
LARISSA - Infectou
a mamãe! Eu tô viúva e órfã!
NEIDE - Calma
lá! É só um espirro.
LARISSA - Primeiro
um espirro. Depois todos os outros sintomas, e quando você vê tem sangue saindo
pelas suas extremidades.
NEIDE - Sangue?
FLÁVIO -
Extremidades?
LARISSA - Meu
Deus! É uma tragédia! Mamãe, vá com o Flávio. Você está do lado dos infectados.
NEIDE - Isso é
um insulto, Larissa! Eu tô saudável!
LARISSA -
Saudável? A senhora vive doente pelos cantos. Isso é só mais um agravante.
Neide sem
graça. Concorda, vai com Flávio. Bozena e doutor Pacheco entram. Larissa abraça
a empregada.
LARISSA - Bozena,
graças a Deus!
BOZENA - A
senhora tá doida, dona Larissa?
LARISSA - Tô não.
Mas vai, cadê a dona Márcia? Preciso dela com urgência.
BOZENA - Dona
Márcia tá com uma gripe fortíssima, tá sem voz. Eu tô no lugar dela.
LARISSA - Meu
Deus! A doença chegou na pintora de rodapé. É uma calamidade pública.
DOUTOR
PACHECO - Doença? Que doença?
LARISSA - O senhor
é médico?
BOZENA - Doutor
Pacheco, veio pra tratar do seu Flávio.
LARISSA - Graças a
Deus. Doutor Pacheco, o caso é gravíssimo!
FLÁVIO - Não
exagera, Larissa. A gente nem tem certeza.
DOUTOR
PACHECO - Quais são as suspeitas?
LARISSA - Ebola,
doutor! Ebola!
Doutor
Pacheco recua, assustado.
DOUTOR
PACHECO - Ebola?
LARISSA - Sim.
Flávio veio da África hoje com essa gripe estranha. Tá contagiando todo mundo!
Mamãe já virou vítima. A anã também.
DOUTOR
PACHECO - Então há uma epidemia no Santa Fátima. Isso é gravíssimo!
NEIDE - Grave
quanto, doutor?
DOUTOR
PACHECO - Tão grave que a senhora vai soltar sangue e fluidos por
qualquer extremidade que tiver. As dores serão horríveis.
NEIDE - Sangue e
fluído?
Neide
desmaia. Larissa vai acudir, o doutor não deixa.
DOUTOR
PACHECO - Sinto muito, Larissa. Não pode chegar perto dela. Ela está
morta!
Todos
chocados, recuam. Larissa começa a chorar. Bozena também.
BOZENA - Isso é
muito triste, daí. Lembra do dia que minha avozinha partiu.
FLÁVIO - Ela
morreu?
BOZENA - Não, ela
fugiu pra Curitiba com um atleta especializado em nudismo.
DOUTOR
PACHECO - Temos que sair daqui. O ambiente é altamente contagioso.
FLÁVIO - Mas e
eu?
DOUTOR
PACHECO - Fique. Você tem pouquíssimas horas de vida. O prédio precisará
entrar em quarentena!
Larissa não
para de chorar. O doutor ampara ela. Eles saem. Bozena leva as crianças. Flávio
fica ali, tenso, olhando pra Neide, desacordada.
FLÁVIO - Droga!
Corta para:
CENA 08:
STOCK SHOTS. EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, EXT.
Imagens
aéreas do Santa Fátima. O prédio isolado, carros de reportagem e ambulâncias do
lado de fora. Homens armados e com roupa de proteção fazem a guarda. Grande
confusão.
Corta para:
CENA 09: APARTAMENTO
202, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Dirce
sentada no sofá vendo a televisão. Nela, uma repórter em frente ao Santa
Fátima.
REPÓRTER - (V.O) Sim, Renato, ao que parece nós
temos o primeiro caso registrado do vírus ebola em território brasileiro. As
autoridades estão em pânico, e por isso um prédio todo, aqui na praia de
Icaraí, Niterói, teve que ser isolado. Os moradores todos estão em quarentena
após um deles chegar do continente africano com uma gripe estranha e contagiar outros.
A equipe procurou a secretaria de saúde e eles não quiseram se pronunciar. Mais
informações na hora da notícia, eu sou Aline Melo.
Dirce
desliga a televisão, apavorada. Nelsinho entra, nota o pânico dela.
NELSINHO - Mãe? Tá
suave?
DIRCE - Não tô
suave não, meu filho. Não tô suave! Tô tudo, menos suave.
Ele senta
ao lado dela.
NELSINHO - E o que
pega?
DIRCE - Menino,
em que mundo você vive? Olha lá fora. Vai na janela.
Ele vai. Volta assustado.
NELSINHO - Eita!
Pra que tanta gente lá fora? Tem uns caras armados!
DIRCE - Parece
que um morador tá com suspeita de ebola, meu filho. E daí o prédio vai ficar em
quarentena!
NELSINHO - Meu
Deus. Que loucura.
DIRCE - E agora?
E se a gente morrer aqui?
Ele abraça
a mãe.
NELSINHO - Fica
fria, coroa. A gente tá sussa.
Genival
entra, espirrando. Dirce e Nelsinho se afastam abruptamente.
GENIVAL - Ei, por
que tem tanto carro lá fora? E por que vocês tão me olhando estranho?
DIRCE - Meu
filho lindo! Não é nada demais, não.
GENIVAL - Então me
dá um abraço de bom dia/
Ele vai se
aproximar, ela berra e sai de perto.
NELSINHO - Leva a
mal não, Genival, leva a mal não. A gente só tá se prevenindo.
Genival vai se aproximar.
Nelsinho e Dirce saem correndo, deixam ele sozinho no apartamento, confuso.
Corta para:
CENA 10:
APARTAMENTO 706, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Vivy
fazendo as unhas no sofá. Patrick levantando pesos ao lado. A campainha toca.
VIVY - Vai
abrir, Patrick.
PATRICK - Ih, nem
vem. Tô ocupado.
VIVY - Eu mais
ainda. Você pode deixar essa porcaria de lado e ir lá. Vai logo!
Ele bufa,
deixa os pesos no chão e vai até a porta. Abre, Genival entra.
VIVY -
Genivaldo?
PATRICK - Não é o
encanador?
GENIVAL - Meu nome
é Genival.
VIVY - Muito
relevante. E daí?
GENIVAL - Tá
acontecendo alguma coisa estranha.
PATRICK - Tipo o
encanador invadir o apartamento da patroa sem maiores explicações?
Genival vai
até a janela. Olha lá pra baixo.
GENIVAL - Vejam
vocês mesmos. O prédio tá cercado. Tem jornalista, polícia, militares, tudo lá
fora. Nesse exato momento.
Patrick e
Vivy vão até a janela.
VIVY - Gente!
Será que aconteceu alguma coisa?
PATRICK - Claro
que aconteceu. A gente só precisa saber o que foi!
VIVY - Que se
dane o que tá acontecendo! Eu acabo de ter uma ideia genial.
PATRICK - Ideia?
VIVY - A
imprensa tá lá fora. É minha chance de entrar nos holofotes, baby.
GENIVAL - Entrar
nos holofotes? Mas será que você cabe lá dentro? Quer dizer, com esses peitões/
PATRICK - Epa!
Olha o respeito.
GENIVAL - O peito
eu tô olhando.
Patrick vai
pra cima de Genival, Vivy não deixa.
VIVY - Deixem
de ser idiotas. Vocês precisam me ajudar no meu plano!
GENIVAL - E a
gente precisa fazer o que?
VIVY - Primeiro
descobrir o motivo de tanta bagunça. E daí pensar em algo!
Genival
espirra.
GENIVAL - Eu posso
ir lá ver.
VIVY - Seja
rápido.
Ele
concorda. Sai. Vivy sorri, Patrick intrigado.
Corta para:
CENA 11:
APARTAMENTO 1003, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA, INT.
Márcia
andando pelo ambiente, aflita. Larissa chorando no sofá, as crianças correndo
na sala. Bozena e doutor Pacheco entram com Dirce e Nelsinho.
BOZENA - Então o
Genival tá infectado, daí? Que tristeza.
DIRCE - É só
desconfiança, Bozena. Ele nem teve contato com algum outro infectado! A gente
só saiu de perto por precaução.
Doutor
Pacheco coloca os dedos nos lábios de Dirce, e ela fica quieta. Ele se
aproxima.
DOUTOR
PACHECO - Seu filho em breve será um saco de sangue e miséria ambulante.
As dores serão tão horríveis que ele irá perder a voz de tanto gritar. Ficará
branco, verde, roxo, e depois cairá no sono eterno.
Ele sai de
perto, rindo.
DOUTOR
PACHECO - Ainda bem que o filho não é meu.
Dirce
começa a chorar, apavorada. Vai ao lado de Larissa, elas choram juntas.
NELSINHO - Pô,
doutor! Assim tu só piora a situação!
DOUTOR
PACHECO - Eu trabalho com a verdade nua e crua, meu jovem.
BOZENA - Lá em
Pato Branco/
Marcia vai
falar. Doutor Pacheco berra.
DOUTOR
PACHECO - Cale-se, dona Márcia! Ou em breve a senhora será mais uma
defunta no Santa Fátima.
Márcia
fecha a boca, triste.
BOZENA - Lá em
Pato Branco tinha um senhor muito conhecido, de nome Jailson Urubu. Ele era
dono de uma das mais famosas funerárias da cidade, a FUDECA.
NELSINHO - Fudeca?
BOZENA - Sigla
pra Funerária do Capeta. Nome bem sugestivo, daí. Jailson tinha fama de estar presente
quase todas as semanas nos hospitais, conversando com parentes de pessoas
gravemente doentes, daí.
DOUTOR
PACHECO - Certamente visando que elas fechassem negócio com sua
funerária. Certo?
BOZENA -
Exatamente, doutor Pacheco. Acontece que Jailson Urubu era um bruto, assustava
todo mundo por onde andava. Agourava e ria da tragédia das pessoas! Dizia
sempre sua famosa frase: 'as lágrimas da sua família são um drink para a
minha'. Todo mundo ficava muito bravo, daí, mas como ele era muito bom, entregavam
seus mortos pro cara.
NELSINHO - E?
BOZENA - E nada,
oras. Tô contando por contar.
DOUTOR
PACHECO - Cale a boca, Bozena. Feche a matraca.
Bozena dá
um berro. Todos espantados.
BOZENA - Cavalo!
Não pense que só porque o senhor é médico pode chegar e dar ordens pra mim,
daí. Empregada também é gente!
Doutor
Pacheco vai se aproximando de Bozena.
DOUTOR
PACHECO - Pois então eu lhe infecto com a doença, sua polaca dos
infernos! Lhe faço ficar como os outros doentes. Quer?
Bozena nega
com a cabeça.
DOUTOR
PACHECO - Ótimo. Então temos que ir aos apartamentos e resgatar os que
estão saudáveis. Os doentes ficarão isolados.
DIRCE -
Doutor... E meu filho?
DOUTOR
PACHECO - Se nada der certo, a gente procura uma funerária.
Ele ri.
Dirce chorando, os outros espantados.
LARISSA - Calma,
dona Dirce. Pelo menos seu filho ainda tá vivo. E minha mãe? Ela já tá morta!
Larissa
volta a chorar.
GUTA - Eu não
quero que o papai morra!
Doutor
Pacheco se aproxima de Guta. Pega em suas mãos.
DOUTOR
PACHECO - Você é uma garota muito bonita, sabia?
GUTA -
Obrigada.
DOUTOR
PACHECO - Larissa, vai preferir cremar ou enterrar a menina?
Doutor
Pacheco se acaba na risada. Larissa pega os filhos pelas mãos.
LARISSA - Eu não
vou ficar aqui com esse doutor sinistro, mas nem por um cacete!
DIRCE -
Concordo! Esse homem é muito frio.
DOUTOR
PACHECO - Sou o único médico daqui. Ou eu fico, ou vocês se ferram.
BOZENA - O filho
da dona Hortênsia é médico! Alguém pode ir ver se ele está em casa, daí.
NELSINHO - Eu! Eu
vou.
DIRCE - Toma
cuidado, meu filho. Não chega perto de ninguém espirrando!
Nelsinho
concorda e sai.
DOUTOR
PACHECO - Se me trocarem vão se arrepender. Tô dizendo.
LARISSA - Cala a
boca, doutor sinistro!
Ele sai de
perto. CAM foca no rosto do
doutor Pacheco, rindo sadicamente.
CENA 11:
APARTAMENTO 301, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Hortênsia
sentada no chão, segurando uma garrafa de vodka e bebendo um pouco. A campainha
toca.
HORTÊNSIA – Já vai!
A campainha
toca mais duas vezes.
HORTÊNSIA – Tá com
fogo na bunda? Tá morrendo alguém por um acaso?
Hortênsia
abre a porta. É Nelsinho, bufando.
NELSINHO – Tem sim,
dona Hortênsia.
HORTÊNSIA – Sim o
que, amor? Quer entrar? Minha cama tá vazia.
Hortênsia
agarra Nelsinho e tasca um beijo em sua boca. Nelsinho desvia, saindo.
NELSINHO – Que isso,
dona Hortênsia?
HORTÊNSIA – Gostou,
chuchu?
NELSINHO – Ah,
minha mãe me chama de chuchu, mas, enfim, eu não vim aqui pra isso. Seu filho tá?
HORTÊNSIA – Não. Foi
numa entrevista de emprego na sua terra, o Cavalão.
NELSINHO – Então tchau.
HORTÊNSIA – Calma. O
que você quer com ele? Não acredito! Você gosta da outra fruta? Meu filho é
macho!
NELSINHO – Não,
claro que não. É que com esse surto de gripe e Ebola aqui no prédio/
HORTÊNSIA – Surto de
Ebola? Não sabia disso.
NELSINHO – Deve ser
porque a senhora só fica aqui dentro bebendo.
HORTÊNSIA – Mas o
que você queria com meu filho? Ele não sabe quase nada de Ebola.
NELSINHO – Pelo menos
acho que ele sabe mais que aquele doutor Pacheco. O cara tá assombrando todo
mundo, falando que os nossos familiares já estão mortos, que não tem mais volta
e tal.
HORTÊNSIA – Ah, que
insensível. Cadê Bozena?
NELSINHO – Tá lá
nesse tumulto todo. Ela tá no lugar da dona Márcia.
HORTÊNSIA – A anã
bateu as botas? (ajoelha) Ah, senhor, muito obrigada. Sonhei tanto com esse dia/
NELSINHO – Não é
isso. Ela tá sem voz, então Bozena tá tomando as decisões.
HORTÊNSIA – Ah,
então ela não morreu? Droga!
NELSINHO – Não.
Agora eu vou indo.
HORTÊNSIA – Pera.
Meu filho conhece um médico que tá estudando sobre Ebola lá nos Estados Unidos.
Eu tenho o contato dele no meu quarto.
NELSINHO – Sério?
HORTÊNSIA – Sim.
Vamos lá.
Nelsinho e
Hortênsia vão até o quarto dela.
Corta para:
CENA 12:
APARTAMENTO 102, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Sarah sentada
no sofá da sala, bebendo um suco de cor verde.
PEDRO – Mãe, é
suco de quê isso aí?
SARAH – Suco detox,
filho. Dizem que previne gripe também. Quer provar?
PEDRO – Eu não.
Vou tomar um refri.
SARAH – Não vai
não. Bebe um suco.
PEDRO – Por quê?
SARAH – Seu pai
encostou nas latas de refrigerante. Vou jogar tudo fora. Ele tá com gripe.
PEDRO – Mas eu
posso passar um pano.
SARAH – Nada disso.
Já disse que não é pra pegar nelas. As bactérias do seu pai são muito
resistentes.
PEDRO – Como você
sabe, mamãe?
SARAH – Sei lá.
Chutei mesmo.
Pedro abre
a geladeira e pega uma jarra com suco de laranja.
Corta para:
CENA 13:
PORTARIA DO EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Vários policiais,
repórteres e fotógrafos na portaria. Genival, Vivy e Patrick chegam. Um
policial (alto, magro, aproximadamente 40 anos, bigode) aproxima-se dos três.
POLICIAL –
Senhores, não podem ficar aqui. O prédio está em quarentena, então voltem para
seus apartamentos.
VIVY – Querido,
eu vim aqui para brilhar e irei!
Vivy
aproxima-se dos jornalistas.
POLICIAL – Senhora,
por favor, afaste-se.
Vivy faz várias
poses para as câmeras. Vivy puxa Genival e Patrick. Ela coloca cada um de um
lado dela e agarra os dois.
POLICIAL – Senhora/
VIVY – Não ferra,
meu querido. Vá trabalhar!
O policial
aproxima-se de Vivy com uma algema na mão. Ela dá uma joelhada nos órgãos
genitais dele, que cai no chão. Vivy aproxima-se dos jornalistas novamente.
VIVY – Então,
caso alguém queira me contratar para uma novela, série ou filme, só falar com
meu assessor, o Patrick.
HOMEM – Com esses
melões, só se for filme pornô.
Vivy dá uma
bofetada no rosto do homem.
VIVY – Então,
queridos, alguma pergunta?
REPÓRTER – Vivy,
como estão os outros moradores nesse momento?
VIVY – Ah, um
caos. Nem te conto. Ouvi dizer que a síndica, a Márcia anã, está entre a vida e
a morte.
Corta para:
CENA 14: APARTAMENTO
102, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Hortênsia e
Nelsinho no quarto dela.
NELSINHO – Cadê esse
contato do médico, dona Hortênsia?
Hortênsia
empurra Nelsinho na cama e se joga em cima dele. Ele tenta fugir, mas ela o
algema à cama. Ela sai da cama e fica de frente para ele, em pé.
NELSINHO – Me tira
daqui, sua louca. Todo mundo morrendo e você fazendo isso...
HORTÊNSIA – Agora vai
começar o show!
Hortênsia
tira sua jaqueta, sensualmente, e a joga para Nelsinho.
Corta para:
CENA 15:
APARTAMENTO 510, EDIFÍCIO SANTA FÁTIMA. DIA. INT.
Neide caída
no chão. Flávio sentado no chão.
FLÁVIO – (para si
mesmo) Caramba! Como eu vou sair daqui agora? Maldita hora que eu fui espirrar.
Tudo culpa daquele perfume forte da Shirlene.
Flávio
pensativo. CAM foca nele.
CONTINUA...
FIM DO EPISÓDIO
Episódio com argumento e escrito por:
Vinicius Borges
Colaboração e supervisão de:
Vitor Abou
Participação Especial:
Diogo Vilela como Doutor
Pacheco
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