terça-feira, 15 de setembro de 2015

Capítulo 08: Escrúpulos


Marlon parou com seus questionamento e foi pegando logo na maçaneta. Quando ele abriu a porta, viu Solange chorando muito no sofá. Marlon ficou tocado quando viu aquela cena. Ele já chorou muito na vida, mas não suportava ver uma mulher chorar. Ele fechou a porta e foi em direção a Solange.
- Solange. – disse ele com voz fúnebre.
- Marlon, desculpe-me por não ir trabalhar hoje, e que... – ela não conseguiu terminar a frase. O choro foi mais forte.
- Calma Solange, diga-me o que aconteceu.
- Júlio... ele se matou...- ao terminar de dizer a palavra que abalara, novamente caiu no choro.
Assim que ela deu a notícia, Marlon ficou pálido. Não podia acreditar no que acabara de ouvir. Ele estava chorando por dentro, só de pensar que foi o culpado dessa tragédia. Ele pegou um chavena e colocou um chá, para que ela pudesse se acalmar. Antes que ela desse o primeiro gole, falou:
- Ele era o amor da minha vida, Marlon. Foi oito anos de convivência. Oito anos se dedicando, amando, dando carinho. Sonha em casar com ele. A noite, na minha cama antes de dormir, imaginava eu entrando toda de branca, feliz...chorando na hora do sim... queria morrer do lado dele... agora o que será de mim, meu Deus. Só quem já perdeu um grande amor, é que sabe o que estou sentindo.
Depois que Solange proferiu aquela última frase, Marlon pensou no seu passado. Ele não sabia o que era perder um amor, afinal ele se apaixonou inúmeras vezes por várias garotas e nenhuma correspondeu ao sentimento puro e ingênuo. Depois que tomou o chá, ela voltou a expor seus sentimentos:
- Acho que nunca mais vou gostar de alguém...
Nesse momento, Marlon olhou para o chão e pensou na frase que Solange tinha proferido: “ Será que novamente levarei um pé na bunda?”
- Não acredito...Não acreditoo...
Solange levantou-se e foi para a cozinha e pegou uma faca. Marlon foi correndo atrás dela.
- Não quero mais viver. Pra quê? Quero morrer com você, meu amor.
- Não faça isso...vou ti ajudar...quero ti ajudar...talvez foi o destino que quis separar vocês dois...aceite o destino com resignação... pare com isso...quero ti dar meu ombro amigo...me dê essa faca!
Solange ficou parada por segundos. E aos poucos foi soltando a faca. Quando a faca caiu, ela também caiu junto. Marlon correu para levantá-la.
- Venha...vamos sentar no sofá.
Marlon ajudou Solange a sentar-se. Depois que ela deitou no seu ombro, ela adormeceu. Quando sua vizinha chegou, Marlon colocou-a na cama e foi para casa.
Quando Marlon abriu a porta, ele se deitou no sofá e pensou no que tinha acontecido nas últimas vinte e quatro horas.
- Como a vida muda de uma hora pra outra. Quem diria que Solange estaria sofrendo.
Marlon olhou a hora no seu relógio. O ponteiro apontava para as  oito horas.
- Vou dormir. Se é que vou conseguir. Amanhã vai ser um dia muito puxado.
Marlon dirigiu-se a seu quarto. Tomou banho e caiu na cama. Novamente viu a madrugada passar. Não parava de pensar como Solange estava.
Ele não estava triste pela morte de Júlio, mas sim pelo fato de Solange está mal. Sei que Marlon será taxado de desumano, insensível e cruel. Mas aqui já está outro escrúpulo da sociedade. Porquê devo chorar por uma pessoa que não conheço?  É como disse o personagem de Camilo Castelo Branco, o João da Cruz: “morrer por morrer, morra meu pai, que é mais velho”. Esse é um ditado enigmático. Veja ele como uma grande filosofia de vida. Sinto pela morte do meu próximo, de quem conheço, mas não de um estranho. Na sua mente, caro leitor, você deve está sentindo repulsa do personagem. Mas é como diz a psicologia, hoje choro pela sua morte, mas no meu inconsciente, grita esse ditado.
O dia amanheceu chorando. Talvez os céus estejam chorando pela morte de mais um ou pela felicidade de Marlon. Ele levantou-se e foi vestir-se. Depois correu direto para a casa da mãe do defunto. A casa estava lotada. Não pense que quando você morrer, irão lhe visitar só os seus amigos. A sua residência estará lotada...de curiosos, é claro. Vários estarão bisbilhotando seu corpo, sua casa e possivelmente seu viúvo ou sua viúva.
- Por que você se foi meu filho? – disse a mãe em prantos.
No meio das cabeças, ele conseguiu vê Solange. No caminho que separava eles, Marlon viu pessoas sorrindo, fofocando e beatas rezando pela alma do morto. Assim que ela o viu, caiu no choro. Marlon não falou nada. Levou-a para sentar num sofá e ofereceu seu ombro amigo. Depois de algumas horas, eles foram caminhando para o cemitério. Uns iam chorando, outros sorrindo e outros pensando na noite prazerosa que teriam.
Muitos acham que o cemitério e um lugar frio e repugnante. Esse é apenas um sentimento estúpido. O triste não é ser mortal, mas sim seria viver eternamente, entre sofrimento e preocupações, como dizia o escritor português José Saramago. Se pensássemos bem, passamos a vida toda estudando, trabalhando. Com a reserva do dinheiro, compramos uma casa. Talvez essa conquista se torne realidade na nossa velhice. Aí te pergunto, caro leitor, o que adiantou? O melhor investimento, seria um túmulo. Ele será a nossa moradia eterna. Não tenha medo de morre, mas sim de sofrer.
A parte mais triste de um enterro, visão esta da sociedade, estava acontecendo. O coveiro estava começando a jogar a terra no caixão. É nesse momento que as mulheres começam a gritar, chorar e até desmaiar.
Depois que tudo havia acabado, Marlon levou Solange para casa. Ele passou o resto do dia ao lado dela. Ele dormiu lá, num quarto de hóspede. Quando ele acordou, foi preparar o café da manhã e assim que ficou pronto, foi levar na cama dela.
- Vamos acordar Solange. Olha o que eu preparei pra você.
Solange olha e dá seu primeiro sorriso desde o acontecimento trágico.
- Obrigada, mas...estou sem fome.
- Coma. Nem que seja um pouco...por mim, vai.
- Ta bom.
Solange provou o iogurte e disse:
- Que bom que tenho um chefe e um amigo. Obrigada pelo seu apoio.
- Imagina. Não tem nada que agradecer. Fico feliz em ser seu amigo.
Depois de pesar no seu passado, ele disse:
- Nunca tive um amigo. Num sai de casa. Sempre fiquei estudei. Hoje em dia é fácil ter colegas, agora amigos... fico triste em ser assim...amargurado. Mas foram as pessoas que tornaram-me assim... vamos deixar os assuntos do meu passado para lá e vamos comer. De verdade, fico muito feliz em ter conquistado sua amizade.
Os olharam-se nos olhos e sorriram. Marlon tinha acabado de começar a começar e a campainha tocou. Eram policiais.
- Bom dia.
- Bom dia.
- A senhorita Solange está?
- Está, mas encontra-se indisposta, sou o chefe dela, eu dou o recado.
- Diga a ela que as investigações da morte de Júlio Pereira começaram.
- Obrigado. Vou avisá-la.
- Tenha um bom dia.
- Os senhores também.
Marlon foi até o quarto de Solange transmitir o recado.
- Quem era Marlon?
- Uns policiais.
- O que eles queriam?
- Vieram avisar que as investigações foram iniciadas.

- Alô! Tacituria

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