CENA 01/INT./CASA DE ROSICLER/SALA/DIA
Continuação imediata do capítulo anterior.
Danilo nervoso, Társis com raiva. Nínive e Rosicler observam.
TÁRSIS – Anda! Diz logo o que você
veio fazer aqui.
ROSICLER – Ei, ei, ei! A dona da casa
sou eu, então eu é que tenho o direito de fazer as perguntas pra quem entra e
pra quem sai. Mocinho, quem é você?
DANILO – O meu nome é Danilo, eu sou
colega de classe da Nínive.
NÍNIVE – Aquele que eu te falei um
dia, lembra mãe?
ROSICLER – Ah, lembrei. É a tua
paixonite, né?
NÍNIVE – Mãe!
DANILO – Então... a minha mãe faleceu
e eu não tenho com quem morar. Minha casa já tá quase caindo, eu não consigo me
sustentar com meus bicos... enfim, será que eu posso ficar aqui mesmo?
ROSICLER – Claro que pode, meu amor.
Pode ficar à vontade. Só não repara nesse meu figurino de agora. Nem toda nudez
será castigada, hein?
Danilo ri. Társis fica com raiva.
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CENA 02/INT./MOTEL/HALL/DIA
Greg paga a conta à balconista. Ouve-se um celular tocando.
GREG (tel.) – Alô? (t)
Oi, Nenê. (t) Não, eu tô... eu tô saindo de casa. (t) Por que eu não atendia? É
que... bom, o meu celular tava sem bateria. (t) Tá bom, amanhã eu passo aí. Tchau.
Greg sai.
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CENA 03/INT./CASA DE ARTURO/SALA/DIA
Nenê sentada no sofá. Arturo toma café.
ARTURO – Conseguiu falar com o
Presente de Grego?
NENÊ – Que trocadilho horrível,
papai. Eu consegui falar com o Greg sim, mas ele tava tão estranho. Sei lá,
nervoso, se atrapalhava com as próprias palavras.
ARTURO – Ih, já vi tudo.
NENÊ – Já viu o que, seu Arturo?
ARTURO – Não é nada pessoal não, mas
eu acho que você tá sendo chifrada na história.
NENÊ – Como é que é?
ARTURO – Chifrada, traída, seu galo
foi ciscar em outro terreiro. Tá me entendendo?
NENÊ – Eu já entendi, papai. Mas
será que o Greg seria capaz de fazer isso comigo? E pior: com quem ele faria
isso?
ARTURO – Com tanta mulher bonita por
aí no mundo, você ainda faz essa pergunta? E falando em mulher bonita, cadê a
Sandra? Tá na hora dela chegar, não é?
NENÊ – Hoje é folga dela, esqueceu?
ARTURO – Folga? Você nunca me falou
sobre folga da Sandra. Não, isso é inadmissível!
NENÊ – Papai, vamos combinar que
você já tá velho demais pra querer mulher.
ARTURO – Antes velho que chifrudo.
Passar bem.
Sai Arturo. Nenê fica pensativa.
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CENA 04/INT./CASA DE VITÓRIA/SALA/DIA
Vitória e Lucas sentados no sofá.
VITÓRIA – Calma, deixa eu ver se eu
entendi. Você não tá mais suportando a Kátia Flávia e quer acabar tudo com ela?
É isso?
LUCAS – É isso mesmo. Só que esse
não é o único motivo.
VITÓRIA – E qual é o outro?
LUCAS – Você.
Silêncio.
VITÓRIA – Lucas, eu/
LUCAS – Não fala nada, Vitória. Só
sente. Desde que eu te conheci, na praia, eu me apaixonei por você. Podem falar
que é clichê, mas foi amor à primeira vista. Eu quero ser feliz com você,
Vitória.
VITÓRIA – Eu não quero ser pivô da
separação de ninguém. Eu confesso que eu gosto muito de você, bastante mesmo!
Só que eu me sinto culpada por ter rompido um relacionamento, entende?
LUCAS – Eu te entendo, mas não
precisa se preocupar. Como eu já falei, a minha própria noiva deu vários
motivos pra eu me decidir. Eu realmente não quero fazer uma família junto a uma
mulher maluca, que só fala asneira, me envergonha.
VITÓRIA – Mas e a reação dela? E a sua
mãe? Ela deixou claro que não gosta de mim.
LUCAS – Nada disso interessa. A
única coisa no mundo que me importa é ver o teu sorriso todos os dias. Eu te
amo!
(Sonoplastia:
Agora eu já sei – Ivete Sangalo)
Lucas beija Vitória. Os dois vão para o quarto e tiram as roupas
lentamente. Eles fazem amor.
MUSIC
FADE.
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CENA 05/INT./MANSÃO TRINDADE/QUARTO INGRID/DIA
Maria Fernanda procura algo no armário.
MARIA FERNANDA – Cadê?
Cadê? Ai, onde será que esse velho guardou a porcaria do testamento?
Maria Fernanda encontra uma parede falsa.
MARIA FERNANDA – Parece
oca. Ah, até que o papai era esperto. Mas não era mais esperto que eu.
Maria Fernanda empurra a parede e encontra uma gaveta.
MARIA FERNANDA – Achei!
Ela abre a gaveta, encontra uma pasta e de lá tira um papel.
MARIA FERNANDA – Como
assim não tem nada pra mim? Velho filho da mãe! Não deixou nenhuma parte da
herança pra mim. Ah, mas não vai ser assim mesmo.
Maria Fernanda guarda o testamento no bolso de seu vestido, vai
até o computador, abre um novo documento e começa a digitar um novo testamento.
Ao imprimir, coloca na pasta, guarda na gaveta e fecha a parede
falsa.
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CENA 06/EXT./STOCK SHOTS/RIO DE JANEIRO/DIA
Entardece no Rio de Janeiro. Dia nublado.
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CENA 07/INT./MANSÃO TRINDADE/SALA/DIA
Maria Fernanda sentada no sofá. Entra Lucas.
MARIA FERNANDA – Onde você
estava?
LUCAS – Dando uma volta. Por quê?
MARIA FERNANDA – Estranhei
você sair tão de repente e voltar só agora, quando tá quase anoitecendo.
LUCAS – Cadê a Kátia Flávia? Eu
preciso falar com ela.
MARIA FERNANDA – Aquela
ali é folgada, você sabe. Tá tomando banho no seu banheiro.
Lucas sobe as escadas.
MARIA FERNANDA – De nada!
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CENA 08/INT./MANSÃO TRINDADE/QUARTO LUCAS/DIA
Barulho de água caindo. Entra Lucas.
KÁTIA FLÁVIA (off) – Quem tá
aí?
LUCAS – O dono do quarto e do
banheiro.
KÁTIA FLÁVIA (off) – Luquinhas,
amor! Já tô indo aí, deixa só eu terminar o banho.
MATCH
CUT.
Kátia Flávia enrolada na toalha. Lucas sério.
KÁTIA FLÁVIA – Cê tá tão
sério, amor. O que aconteceu? Quer um beijinho?
Kátia Flávia tenta beijar Lucas, que se esquiva.
LUCAS – Pra começar, nada de “amor”,
nem muito menos beijinho.
KÁTIA FLÁVIA – Você tá
me deixando preocupada. O que eu fiz?
LUCAS – Só fala besteira, não se
importa com a minha família, me dá vergonha. Acabou, Kátia Flávia! Eu não sou
mais seu noivo.
Lucas tira a aliança e a joga no chão.
Kátia Flávia arrasada.
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CENA 09/INT./CASA DE ROSICLER/BANHEIRO/DIA
Danilo toma banho.
Flashes da morte de sua mãe e do enterro.
DANILO – Que saudade, mãe...
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CENA 10/INT./CASA DE ROSICLER/SALA DE JANTAR/DIA
Rosicler põe a mesa. Társis desce as escadas.
TÁRSIS – Que horas vai ser o rango?
ROSICLER – Calma, Társis. Ainda tá cedo
pro jantar. Cadê o Danilo?
TÁRSIS – Tá tomando banho. E por
falar naquele trombadinha, que ideia foi essa de abrigar ele aqui na nossa
casa?
ROSICLER – Qual é o problema? Ele não é
trombadinha, a Nínive me fala muito bem dele.
TÁRSIS – A Nínive é uma paspalha, tá
cega de amores pelo Danilo. Mas na verdade ele é ladrão, eu tenho certeza.
Rosicler para de arrumar a mesa.
ROSICLER – Társis, que preconceito é
esse? Eu não te eduquei assim, eduquei?
TÁRSIS – Eu não sou preconceituoso,
mas é a verdade. Preto é tudo ladrão, ainda mais preto pobre. Esses são os
piores.
ROSICLER – Eu ainda não tô crendo que
você tá falando essas coisas. Barack Obama, Martin Luther King, Nelson
Mandela... conhece?
TÁRSIS – E você acha mesmo que essa
cambada de escurinho é do bem? Toda essa pose de bonzinho serve pra dizer que
os negros também são gente. Mas eu não caio nessa. E se você continuar
permitindo que essa... coisa more aqui, eu saio. Você escolhe: ou ele, ou eu.
ROSICLER – Posso te falar uma coisa?
Quem vai ficar é o Danilo, você que se arrume por aí. Eu tenho vergonha de ser
sua mãe.
TÁRSIS – Você não tá falando sério.
ROSICLER – Já tá escurecendo e à noite
aqui no Rio é mais difícil e perigoso encontrar lugar pra morar. Anda, pega
suas coisas!
TÁRSIS – Tudo bem. Eu vou. Mas eu
nunca vou esquecer das suas palavras. Deixa só eu fazer minha mala.
Társis dá meia volta e sobe dois degraus.
ROSICLER – Társis, volta aqui. Eu
esqueci de uma coisa.
Társis volta.
TÁRSIS – O que foi agora? Vai me dar
mais sermão por eu falar a verdade?
Rosicler cospe em Társis.
ROSICLER – Agora pode ir. Já te dei o
que você merece. Moleque!
Társis encara Rosicler.
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CENA 11/EXT./RIO DE JANEIRO/RUA/DIA
(Sonoplastia:
Am I Wrong – Nico & Vinz)
SLOW MOTION: Chove muito. Társis perambula com uma mala, sem
guarda-chuva.
(Music
fade) Corta para:
CENA 12/INT./MANSÃO TRINDADE/QUARTO LUCAS/DIA
Kátia Flávia enrolada na toalha, arrasada. Lucas sério.
KÁTIA FLÁVIA – Lucas,
pelo amor de Deus, me diz que isso é um pesadelo e eu vou acordar agora.
LUCAS – Pesadelo é o que eu tenho
que aguentar todos os dias com você e com as tuas maluquices.
KÁTIA FLÁVIA – É o meu
jeito, Lucas. Se você não aceita, por que me pediu em noivado?
LUCAS – Foi você quem fez o pedido,
maluca. Você corre atrás de mim desde quando a gente estudava na mesma escola,
eu na segunda série e você na quinta.
KÁTIA FLÁVIA – Você tá
me chamando de velha?
LUCAS – Isso não vem ao caso. O que
eu quero é que você suma daqui. Agora!
KÁTIA FLÁVIA – Mas nessa
chuva? Você quer que eu pegue uma pneumonia?
LUCAS – Tá vendo? Esses seus
exageros também me irritam.
KÁTIA FLÁVIA (chorando) – Poxa,
Lucas, eu nunca pensei que eu ia ser abandonada assim. Agora estou à mercê dos
criminosos, sem um homem forte pra me defender. Oh, vida cruel.
LUCAS – Sem drama, Kátia Flávia! Se
veste logo e sai daqui, não tô com saco pra te olhar.
KÁTIA FLÁVIA – É a
Vitória, né? Eu tenho a mais absoluta certeza que aquela oferenda fez a tua
cabeça pra me lagar.
LUCAS – Para de falar besteira, já
mandei você sair!
KÁTIA FLÁVIA – Eu saio,
mas isso não fica assim, viu seu Lucas Trindade?
Kátia Flávia pega suas roupas e sai. Lucas deita na cama.
LUCAS – Ah, meu Deus...
CAM focaliza a aliança jogada no chão.
Corta
para:
CENA 13/EXT./RIO DE JANEIRO/RUA/DIA
(Sonoplastia:
Kátia Flávia – Fausto Fawcett)
Cortes descontínuos de Kátia Flávia, de toalha, andando pelas
ruas. A chuva continua.
Um carro espirra água em seu corpo.
KÁTIA FLÁVIA – Filho da
mãe! Barbeiro!
(Music
fade) Corta para:
CENA 14/INT./CASA DE NENÊ/SALA/DIA
A campainha toca. Nenê atende. Kátia Flávia.
NENÊ – O que significa isso?
KÁTIA FLÁVIA – Significa
que eu não tive tempo de me vestir, né prima?
Kátia Flávia entra.
NENÊ – Mas por que você não veio de
carro? Vai pegar uma gripe das brabas, cê sabe né?
KÁTIA FLÁVIA – Tanto
faz, Nenê, tanto faz. Mulher, nem te conto...
NENÊ – Me conte.
KÁTIA FLÁVIA – Te conto!
O Lucas terminou comigo, acredita?
NENÊ – É sério? Me conta mais, me
conta tudo!
KÁTIA FLÁVIA – Ele veio
com uma desculpinha de que eu sou maluca, que eu sou isso, sou aquilo... mas eu
tenho certeza que o motivo do término é a Vitória Palmatória.
NENÊ – Quem é essa?
KÁTIA FLÁVIA – É uma
modelo sem-vergonha e safada que virou a cabeça do meu Lucas. Mas isso não vai
ficar assim! Eu não vou perder o din... quer dizer, o Lucas.
NENÊ – Vê lá o que você vai fazer,
hein?
KÁTIA FLÁVIA – Fica
tranquila. Mas e você, como é que vai?
NENÊ – Sendo chifrada.
KÁTIA FLÁVIA – Também?
Amiga, estou bestificada. Vamos montar um bloco de carnaval: Passivos da
Traição.
NENÊ – O Greg, meu namorado, aquele
da academia, tá me traindo. Pelo menos é o que eu acho.
KÁTIA FLÁVIA – Ah, então
você tá com neura achando que seu macho foi beber água em outros copos?
NENÊ – Eu tô desconfiando disso
desde hoje cedo, quando eu liguei pra ele e ele parecia nervoso. Ontem eu nem
vi ele, nem sei onde ele passou a noite. E quem botou isso na minha cabeça foi
o papai.
KÁTIA FLÁVIA – E desde
quando o seu Arturo tem experiência com mulher? Tirando eu, você e aquele
caniço que cuida dele, nunca existiu mulher na vida dele.
NENÊ – Ah, e eu nasci de chocadeira
Kátia Flávia, foi isso? Respeita o meu pai.
KÁTIA FLÁVIA – Ok, mas
então se é verdade que esse Greg tá pegando duas de uma vez, será que não pode
pegar a terceira aqui?
Nenê joga uma almofada em Kátia Flávia.
NENÊ – Safada!
KÁTIA FLÁVIA – Calma,
Nenê. É que eu já tô sentindo a SPB.
NENÊ – O que é isso?
KÁTIA FLÁVIA – Síndrome
do Pé na Bunda.
NENÊ – Que infantil isso. Bom, mas
vai tirando essa sua bunda molhada do meu sofá, vai se enxugar e se vestir.
KÁTIA FLÁVIA – Bunda
molhada é?
NENÊ – Tarada! Vamo, circulando!
Nenê empurra Kátia Flávia para o banheiro.
Corta
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CENA 15/EXT./STOCK SHOTS/RIO DE JANEIRO/DIA-NOITE
(Sonoplastia:
Muito Gelo e Pouco Whisky – Márcia Fellipe)
A chuva finalmente cessa. Anoitece.
Plano geral da Mansão Trindade, iluminada.
(Music
Fade) Corta para:
CENA 16/INT./MANSÃO TRINDADE/SALA DE JANTAR/NOITE
Maria Fernanda, Ingrid e Lucas sentados à mesa, do lado direito.
O advogado na cabeceira. Os empregados observam, de pé.
ADVOGADO – A leitura do testamento já
irá começar. Todos de acordo?
INGRID – Sim, pode começar.
ADVOGADO – Eu, Otávio Ramos Trindade,
descrevo abaixo minha vontade para a divisão de meus patrimônios. Para Ingrid,
minha esposa e companheira por toda a vida deixo minha chácara no Espírito
Santo e 20% das ações da Empresa Trindade.
Para meu motorista, Adamastor, deixo minhas roupas e um dos meus carros,
que pode ser vendido pelo valor que o mesmo desejar. Para cada uma das
empregadas, independentemente de suas funções, deixo 20 mil reais em dinheiro.
Para Lucas, meu querido neto, deixo 30% das ações da empresa. E, finalmente,
para Maria Fernanda, minha filha única, deixo a mansão, onde vivemos durante
toda a vida, e 50% das ações de minha empresa, tornando-a, assim, acionista
majoritária da Trindade Joias. Estes são meus requisitos para a divisão de
bens.
MARIA FERNANDA (sussurra) – Bingo!
FIM DO CAPÍTULO
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